A Medida Provisória 413, de 3 de janeiro de 2008, que aumentou a alíquota e a abrangência do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e majorou a taxa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das instituições financeiras, de 9% para 15%, ao mesmo tempo em que manteve os incentivos para aplicações especulativas no mercado financeiro doméstico, pretendeu também dispor a respeito de questões tarifárias.

De fato, a própria exposição de motivos da MP 413 declara que um dos seus objetivos é precisamente o de “reforçar o sistema de proteção tarifária brasileiro”. Assim, no artigo 2, a MP 413 manda aplicar a alíquota específica de R$ 10 por quilograma líquido, ou por unidade de medida estatística da mercadoria, para o cálculo do Imposto de Importação sobre as mercadorias classificadas nos capítulos 22 (bebidas alcoólicas), 39 (plásticos), 40 (borrachas), 51 a 64 (lãs, fibras têxteis, filamentos, fios, tapetes, tecidos, vestuários e calçados), 82 (talheres), 83 (metais diversos), 90 (instrumentos ópticos e médico-cirurgicos), 91 (aparelhos e partes de relojoarias), e 94 a 96 (móveis, brinquedos e obras diversas), da NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul), em substituição à alíquota ad valorem correspondente da TEC (Tarifa Externa Comum do Mercosul).

Ora, a TEC, como é sabido, decorre do Tratado de Assunção, de 1991, que criou o Mercosul, no qual o Brasil, juntamente com Argentina, Paraguai e Uruguai, concordaram na renúncia coletiva a diversas manifestações da soberania nacional, inclusive na área tarifária, em prol de um pacto regional de comércio. De fato, a tarifa externa comum é um dos objetivos enunciados pelo referido Tratado.

Assim, desde a criação da TEC, em 1 de janeiro de 1995, o Brasil deixou de poder fixar unilateralmente suas tarifas ou imposto de importação. Conclui-se, portanto, que a medida provisória é um meio não eficaz para tratar de matéria de competência de tratado internacional, o que resulta na nulidade de pleno direito do artigo 2 e seu parágrafo único, da MP 413.

De mais a mais, a pretensão do governo brasileiro de fixar uma tarifa de importação com base em critérios outros que o valor da mercadoria colide com a ordem jurídica multilateral da OMC (Organização Mundial do Comércio). De fato, o artigo VII, 2, a, do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) 47, ainda em vigor, dispõe que o valor para fins alfandegários de uma mercadoria, sobre o qual que impõe uma tarifa, deve ser o valor real do bem em questão e não outro, “arbitrário ou fictício”, que é justamente o critério da MP 413.

O efeito da inconsistência do disposto no artigo 2 da MP 413 com a ordem jurídica multilateral é um que sujeita o Brasil a processos dos países prejudicados, perante o sistema de resolução de disputas da OMC. Dada a vasta abrangência da pretendida nova tarifa ad rem , é de se prever uma avalanche de ações contra o Brasil naquele foro internacional, com graves conseqüências para o comércio exterior do país.