São Paulo– No próximo dia 6 de agosto, as pessoas de bem lembrarão compungidas o decurso do sexagésimo aniversário do monstruoso crime cometido contra a população civil de Hiroshima, no ano de 1945, ao final da 2ª Guerra Mundial, pelas forças armadas dos Estados Unidos da América (EUA). Como decorrência direta da explosão nuclear, 140 mil homens, mulheres e crianças pereceram nas horas seguintes. Mais 60 mil morreriam ainda como resultado dos efeitos retardados da radiação. Três dias mais tarde, o holocausto seria repetido contra a população civil de Nagasaki, onde cerca de 70 mil habitantes expiraram como resultado direto da detonação da bomba atômica.
Foi a primeira vez na história em que se utilizaram armas de destruição em massa e as únicas ocasiões em que artefatos nucleares foram utilizados militarmente. Durante muitos anos, os vencedores do conflito armado procuraram ofuscar e, muitas vezes, esconder a verdade histórica de tamanho crime contra a humanidade.
Tal falsificação histórica começou com a retratação da motivação do governo dos EUA, sob a liderança do então presidente Harry Truman, em lançar mão de tal abominável meio. Por muitos anos e até hoje, os historiadores americanos e britânicos, de um modo geral, justificam a terrível decisão como tendo sido inspirada no anseio de salvar vidas dos militares aliados envolvidos na campanha do Pacífico. Acresce que a maior parte das obras históricas trata do período em referência, com grande insensibilidade, sem discorrer a respeito das vítimas do horrendo crime.
Na realidade, meses antes da data fatídica, e certamente a partir do dia 5 de maio de 1945, o governo japonês procurava meios de apresentar sua rendição aos aliados, o que era sabido pelo governo dos EUA, depois de sondagens diplomáticas realizadas em Moscou. Em resposta, os japoneses receberam o ultimato de Potsdam de rendição incondicional sob pena de “pronta e total destruição”, ao qual se seguiram as explosões nucleares.
De fato, já na ocasião, antevendo o final do conflito armado, procuravam os estrategistas dos EUA a posição de influência hegemônica no pós-guerra e identificavam a então URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) como o rival, quiçá inimigo, do futuro próximo. Assim, o tenebroso uso das armas nucleares teria tido o efeito de causar a capitulação imediata do Japão, bem como o de intimidar a URSS.
O racismo prevalente na ocasião contra os japoneses em particular, e contra os orientais, de um modo geral, atenuou as resistências à decisão, no âmbito interno dos EUA. A propaganda e a censura militares fizeram o resto. Quando foram constituídos os tribunais de crimes de guerra de Nüremberg e de Tóquio, ambos assentados em leis ex post facto, faltaram nos bancos dos réus os agentes das atrocidades cometidas pelos aliados.
A evocação da data fatídica do holocausto de Hiroshima nos leva a recordar os horrores da guerra nuclear. Assim, inspiram-se os homens de boa vontade na necessidade de promoção da proibição generalizada e universal de armas nucleares. Da mesma maneira, fica evidente a necessidade de um sistema jurídico internacional que propicie a contenção das potências nucleares e de seus abusos.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).