São Paulo – Na última sexta-feira, dia 13 de março de 2009, encontraram-se, em Washington, EUA (Estados Unidos da América), os presidentes do Brasil, Luís Inácio Lula da Silva, e dos EUA, Barack Obama. Na agenda, estavam trabalhos preparatórios para a formatação dos entendimentos a serem levados a efeito na próxima reunião do G-20, em Londres, para tratar da crise financeira e econômica que afeta o mundo.
O encontro dos dois presidentes abre um precedente de grande importância, porque geralmente a agenda das grandes reuniões internacionais é fechada pelo Estado hegemônico, e seus aliados, e só então apresentada em conjunto aos Estados periféricos ou em desenvolvimento, para simples ratificação ou ainda sua mais resignada aceitação.
Dessa vez, no entanto, a reunião deu-se com o Brasil isoladamente, o que sem dúvida denota um respeito maior pela crescente relevância que o País tem nas relações internacionais, em geral, e sua liderança regional e também, em particular, com relação a outros países em desenvolvimento.
Não que os representantes dos EUA tenham perdido o hábito de apresentar fatos consumados; old habits die hard, como se diz por aquelas plagas. Pelo contrário, apresentaram uma lista de pontos que haviam já previamente acordado com o seu Estado cliente favorito, o Reino Unido, parceiro tradicional na bonança da exploração de terceiros países, como na desgraça da falência dos mercados financeiros.
Como é sabido, o Reino Unido, desde a crise do Canal de Suez, na década de 50, alinha automaticamente sua política externa com aquela dos EUA, renunciando à sua independência de formulação. Para os EUA, um aliado incondicional como o Reino Unido, apesar de arruinado, tem sua importância como fator de bloqueio de políticas da União Européia que sejam desinteressantes ao primeiro.
Assim, combinaram EUA e Reino Unido, quando da visita do infeliz, trôpego e desmoralizado primeiro-ministro Gordon Brown aos EUA, no início de março e cerca de 10 dias antes daquela do presidente Lula que, enquanto os britânicos defenderiam a agenda comum aos europeus, os americanos procurariam convencer os brasileiros e os chineses, dentre outros interlocutores.
Assessorado pela habitual armata brancaleone de bonecos(as) de ego inflado do Itamaraty, mas deficientes nas tratativas de poder das relações internacionais, o Presidente Lula chegou à reunião preparado para cobrar um preço pelo eventual apoio à agenda estratégica americana: a liberalização das importações de etanol.
Ao fazê-lo, demonstrou que sua política externa não evoluiu com relação àquela da ditadura de Getúlio Vargas, no período que antecedeu a declaração de guerra do Brasil às chamadas potências do Eixo, e no qual o País mendigava favores aos EUA. De fato, o Brasil perdeu a oportunidade de influir na formatação da agenda de negociações, algo em que sistematicamente o Itamaraty tem falhado nas relações multilaterais e, mais ainda, nada conseguiu com relação ao etanol.
Assim, o Brasil deixou de poder influenciar a regulamentação internacional dos mercados financeiros mundiais, que certamente será tratada em Londres, e que tem grande importância para os nossos interesses, em diversos aspectos dos mercados acionários e valores, mas também no tocante à erradicação dos paraísos fiscais.
Nesse último particular, nosso país figura entre as vítimas do pacto espúrio entre os agentes do crime organizado e jurisdições que se colocam acima da lei, da ordem e da moralidade, para pilhar os governos dos países em desenvolvimento. Os britânicos e os americanos têm hoje, em conjunto, cerca de um terço dos cerca de US$ 10 trilhões depositados em regime “off-shore”, sendo os grandes beneficiários do sistema.
Esse fato, não impediu que o primeiro-ministro Gordon Brown, que por muitos anos teve sob sua responsabilidade a administração das cloacas financeiras de Londres, Jersey e Ilhas do Canal, de se tornar hoje um grande defensor da erradicação dos regimes de paraíso fiscal. Trata-se da típica hipocrisia britânica a serviço da realidade prática da necessidade de se tributar tais volumes extraordinários de recursos, para fazer frente aos crescentes déficits fiscais do RU e também dos EUA.
Da mesma forma, o Brasil irá aceitar qualquer formulação dos americanos a justificar o apoio fiscal, i.e. novos subsídios, que irão dar uma vantagem comparativa artificial e ilegal aos nossos competidores, em detrimento dos interesses dos nossos setores industrial, de serviços e agrícola. O regime jurídico multilateral valerá para os países em desenvolvimento, apenas. Para os demais, tudo é permitido, volta o laissez faire.
É dentro desse contexto que deve ser interpretada a negativa americana em liberalizar o regime do etanol, o que representaria uma dissonância com aquilo que já se pratica e que se busca homologar em Londres, com a complacência dos incompetentes agentes diplomáticos do Brasil. Os efeitos práticos da inépcia diplomática do governo Lula equivalem-se aos da pusilanimidade da “diplomacia sem sapatos” do governo FHC.
Quarta-feira, 18 de março de 2009
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).