São Paulo – A independência da advocacia é plena e claramente assegurada pelo direito internacional, não com o objetivo de constituir vantagens de natureza pessoal ao advogado, mas para o nobre propósito da proteção dos povos, das sociedades e dos indivíduos, de maneira a assegurar-lhes as condições essenciais para a tutela de seus direitos no contexto de uma ordem jurídica justa, livre e democrática.
Assim, o direito internacional reconhece e consagra a independência da advocacia como uma condição necessária para que sejam assegurados, inter alia, os direitos humanos, objeto de um número grande de convenções transnacionais muito caras à Humanidade. Dessa maneira, os efeitos da independência da advocacia têm uma grande relevância prática.
A independência da advocacia deve ser interpretada à luz do direito internacional tanto com relação com fatores políticos, quanto com a sua própria clientela. De fato, como é reconhecido pelos Princípios Básicos das Nações Unidas sobre o Papel dos Advogados, adotados em Havana, aos 7 de setembro de 1990, o advogado não pode ser confundido com o seu cliente nem com a causa que representa (artigo 18).
Da mesma maneira, de acordo com os Princípios Básicos, deve ser assegurada a independência da advocacia com relação aos agentes políticos, de maneira que o advogado possa funcionar sem intimidação, assédio, pressões ou interferência indevida nas suas atividades profissionais, pelo que sua pessoa deve ser preservada de sanções ou respectivas ameaças por força de sua atuação advocatícia (artigo 16).
De fato, como bem lembrado pelo ministro da corte suprema da Austrália, Michael Kirby AC CMG, “uma das características do direito que tende a irritar outras fontes de poder é a luta dos profissionais do direito —juízes e advogados— pela independência”. É certo que tanto os poderosos como os criminosos não se conformam com uma fonte de poder que não se pode comprar: a consciência dos advogados e os tribunais.
Como consequência do reconhecimento da importância fundamental da independência da advocacia, ela vem assegurada, inter alia, no artigo 10 da Declaração Universal dos Direitos Humanos; no artigo 14.1 da Convenção Internacional de Direitos Civis e Políticos; no artigo 6 da Convenção Européia para a Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais; no artigo 7 da Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos; no artigo 8 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos; e no artigo 3 da Carta Democrática Inter-Americana.
O Código de Conduta do Conselho das Ordens de Advogados da Europa (CCBE), o mais avançado documento deontológico das profissões legais existente no direito comparado, determina, no seu artigo 2.1.1., que “os muitos deveres impostos ao advogado exigem a sua absoluta independência, livre de qualquer outra influência, especialmente as que possam advir de seus interesses pessoais ou pressão externa… Um advogado não pode transigir seus padrões profissionais para agradar o cliente, a corte ou a terceiros.”
É a manifestações dessa independência que, no Brasil, se refere o artigo 133 da Constituição Federal, ao assegurar a inviolabilidade do advogado no exercício de sua profissão, e o artigo 7 da Lei 8906/95, ao elencar dentre os direitos do advogado o exercício da profissão com liberdade.
Se a atuação individual do advogado deve ser independente, o mesmo deve ocorrer com a associação de classe, dentre nós designada ordem dos advogados. De fato, os Princípios Básicos das Nações Unidas, em seu artigo 24, determinam que “o órgão executivo da associação profissional deve ser eleito pelos seus membros e exercer suas funções sem interferência externa.”
Assim, deve a advocacia zelar não apenas que atuação de cada profissional do direito seja independente, mas também assegurar que as ordens dos advogados estejam sempre livres de interferências externas de ordem pessoal, do poder político ou econômico, ou ainda de outra maneira estranha aos seus fins.