Brasília – O Ministério da Justiça e o Conselho da Ordem dos Advogados da Índia manifestaram-se, ao final do ano passado, no sentido de vetar o funcionamento de advogados estrangeiros naquele país. Anteriormente, trinta e um escritórios estrangeiros, principalmente americanos e ingleses, já estavam respondendo nas barras dos tribunais indianos a ações por fraude à lei, movidas por associações de advogados da Índia.

Dentre as acusações elencadas contra os escritórios forâneos contam-se violações da ordem pública indiana; falsidade ideológica; publicidade ilegal; prestação ilegal de serviços regulados; e a fraude fiscal.  Aproximadamente na mesma época, a Ordem de Advogados de Xangai, na China, tomou medidas contra alguns escritórios estrangeiros que apresentavam conduta assemelhada.

Como é sabido, com o esgotamento dos seus mercados internos, agravado que foi pelos efeitos da crise financeira e econômica iniciada em 2008, escritórios de advogados, particularmente dos EUA  e do Reino Unido, buscaram sua inserção nos mercados internacionais, com o objetivo de aumentar sua base de clientela e de prestação de serviços jurídicos.

Nos EUA, há cerca de 1.150.000 advogados, com um desemprego hoje acima da média nacional, que se situa na casa dos 9%. Portanto, há nos EUA 1 advogado para cada grupo de 300 pessoas (sic). Mais ainda, no país, formam-se cerca de 45.000 novos advogados por ano, dos quais apenas 18.000 conseguem obter empregos na área jurídica.

No Reino Unido, numa economia muito menor do que aquela americana, há cerca de 16.000 novos advogados por ano, dos quais menos de um terço consegue emprego na área legal. A receita dos escritórios ingleses caiu mais de 15% no período posterior à crise, levando muitos à insolvência.

Assim, não é de se admirar que tais escritórios procurem mercados a conquistar. É o seu objetivo estratégico. No passado, eles ainda valiam-se dos préstimos de seus respectivos governos em negociações multilaterais, na tentativa de obter concessões dos principais países alvo: o Brasil, a China e a Índia.

Hoje, contudo, com o desespero pela inviabilidade de seus modelos estruturais, passaram os escritórios estrangeiros a forçar a porta de entrada, ainda que em violação à lei doméstica e ao regime jurídico multilateral de regência. Tudo isso apesar de se anunciarem membros de uma profissão que em primeiro lugar deveria cumprir a lei.

Tais escritórios são organizados no exterior de forma que viola a legislação do Brasil, da China e da Índia. No Reino Unido, por exemplo, eles deixaram de ser escritórios de advogados, como define um tratado no âmbito da ONU e conforme decidiu o próprio CCBE (Conselho de Ordens da União Européia), para ser organizações de serviços, mais assemelhadas a bancos de investimentos, com acionistas e prestadores de serviços não advogados.

Nos EUA, como também no Reino Unido, a publicidade dos escritórios não está sujeita às restrições existentes no ordenamento jurídico do país alvo. Igualmente, em nenhum dos dois casos, há respeito à ordem jurídica interna. De mais a mais, os países de tais escritórios discriminam os advogados brasileiros, chineses e indianos, da mesma forma que apresentam barreiras horizontais ao acesso à profissão em seu território.

Há quase tudo em comum entre o ocorrido na Índia e aquilo que hoje observamos no Brasil. De fato, a primeira providência que tais organizações estrangeiras procuram implementar é tirar da jurisdição brasileira, chinesa ou indiana a competência para apreciar disputas, numa fraude conceitual à aplicação territorial da lei do país em questão.

Da mesma forma, é ignorada a jurisdição da Ordem dos Advogados doméstica, bem como os interesses e direitos dos consumidores, que são enganados quanto à capacitação profissional de tais organizações.

Iremos, no Brasil, reagir à moda da Índia?