Londres – O presidente dos EUA (Estados Unidos da América), Barack Obama, anunciou no dia 17 de junho de 2009 um muito necessário pacote de medidas destinadas a reformular a existente regulamentação dos mercados financeiros daquele país, esta mesma que se mostrou dramaticamente ineficiente para coibir os abusos, as fraudes e, numa última instância, a profunda crise que lá se criou já há cerca de 12 meses, expandindo-se mundo afora.
De fato, o sistema regulatório dos mercados financeiros dos EUA mostrava-se, de um lado, excessivamente burocrático e, de outro, altamente ineficaz pela dominação da doutrina da chamada auto-regulação dos mercados nas agências governamentais. Assim, os EUA têm 5 agências federais a regular o sistema bancário, mais 50 agências estaduais com poderes análogos, uma agência federal de mercado de capitais e outra de poupança.
A iniciativa do presidente dos EUA deverá ainda ser aprovada pelo congresso daquele país. Por conseguinte, talvez em nome de um realismo político, as medidas tenham sido tímidas e descontentado, ao mesmo tempo, tanto aqueles que desejam uma moralização do prostituído, infecto e corrupto mercado financeiro, bem como os que desejam a manutenção do status quo ante, em nome da liberdade de fraudar e lucrar a qualquer preço.
Para os primeiros, a manutenção de todas as agências bancárias hoje existentes, sem uma racionalização, deverá contribuir para uma continuada excessiva burocracia acompanhada de confusão regulatória. Apenas a autridade de poupanças, denominada OTS (Office of Thrift Supervision) deverá desaparecer, substituída por uma nova Agência de Proteção do Consumidor Financeiro.
Contudo, ao meu ver, a constituição da agência federal de proteção ao consumidor financeiro atende a uma imperativa necessidade de defender os interesses dos maiores prejudicados da crise que hoje afeta o mundo. A África do Sul é pioneira em legistação de proteção ao consumidor financeiro, onde os abusos do sistema bancário ao indefeso cidadão foram drasticamente reduzidos. O Brasil faria bem em evoluir no mesmo sentido.
Ainda de acordo com o pacote do presidente dos EUA, a supervisão das companhias financeiras será feita pelo FED (Federal ReserveBank) e por um novo Supervisor Nacional Bancário. Os fundos de trava (hedge), que se tornaram em sua maioria cassinos sem a menor credibilidade, deverão ser registrados com a comissão de valoresmobiliários do país, a SEC (Securitiesand Exchange Commission). É de se pasmar que se tenha permitido aos fundos de trava emitirem valores mais de 10 vezes superiores ao PIB mundial sem registro ou supervisão, até os dias de hoje.
O novo pacote procura ainda promover maior transparência e eficiência na regulamentação dos mercados financeiros, com supervisão das patéticas agências de avaliação de crédito, agentes corresponsáveis pelo colapso dos mercados.
Contudo, dentre as novas medidas, abstém-se o governo americado de proibir práticas fraudulentas já bastante conhecidas.
Contempla, ainda, o governo americano maiores poderes de intervenção do FED, como por exemplo possue o Banco Central do Brasil desde 1965, com a legislação bancária da época. Por outro lado, a iniciativa de Barack Obama prevê a necessidade de cooperação internacional em questões financeiras, o que é um grande progresso num país habituado ao unilateralismo e ao exercício arbitrário da próprias razões nos foros internacionais.
Dias após o anúncio das medidas em comento, a UE (União Européia), velho cliente dos EUA, anunciou estudos para lançar, num futuro próximo, um semelhante pacote de medidas. Por sua vez, as forças do crime organizado que se beneficiaram com o clima de favorecimento às fraudes financeiras, que prevalece até hoje, opõe-se às iniciativas, invocando os mesmos esfarrapados argumentos providos pelo neoliberalismo.
A situação no Brasil é, sem dúvida, melhor do que aquela nos EUA e na UE. Todavia, o consumidor dos serviços financeiros ainda não recebe a adequada proteção no País. Mais ainda, a regulamentação dos fundos de trava carece de um maior aperfeiçoamento. É ora de nós, brasileiros, também colocarmos as mãos às obras e bem assim acompanharmos os debates internacionais sobre o tema.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).