São Paulo – O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, aproveitou a tribuna da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20 de setembro de 2006, para, na condição de porta-voz dos povos do sul, fazer graves denúncias ao papel deletério dos Estados Unidos da América (EUA) na ordem jurídica internacional. O discurso foi ridicularizado pela imprensa conservadora brasileira, mas teve ampla repercussão internacional e reflete uma acurada observação do cenário mundial, já feita por muitos observadores atentos.
De fato, o presidente da Venezuela constatou o que honestos juristas do mundo todo têm feito à saciedade, i.e., que o “sistema das Nações Unidas, nascido após a Segunda Guerra Mundial, entrou em colapso, desmoronou e não serve”. A ONU, segundo o líder venezuelano, serviria apenas para o exercício da estéril retórica, mas a realidade terrível na qual vive o mundo apresenta a inadiável necessidade de sua reforma.
Para tanto, segundo Chávez, o sistema decisório do sistema multilateral há de ser alterado, começando-se por uma reformulação do Conselho de Segurança, com o acesso de novos membros escolhidos dentre tanto os países desenvolvidos como dentre aqueles em desenvolvimento. Sugere ele ainda a supressão do mecanismo “antidemocrático” do poder de veto.
Mais ainda, clamou o presidente da Venezuela pela aplicação de métodos eficazes de atenção aos problemas e resolução dos conflitos mundiais, o que, é óbvio, certamente só se poderá obter pelo aumento da juridicidade no sistema multilateral, bem como pela maior eficácia da lei nas relações internacionais.
Denunciou em seguida o líder venezuelano a guarida que o sistema multilateral tem dado à perseguição e às agressões oriundas dos países hegemônicos, que são os verdadeiros extremistas, contra os indefesos povos do planeta. Observou ainda que os povos mais sofridos, que são a maioria da população mundial, encontram-se carentes de porta-vozes.
Por outro lado, o presidente sul-americano reafirmou o compromisso da Venezuela na luta contra a violência, contra o terrorismo, bem como sua união a todos os povos que lutam pela paz mundial e pela isonomia entre os povos do planeta.
Infelizmente, a parte do discurso de Chávez que comparou o presidente dos EUA ao diabo, um artifício de oratória, ganhou maior destaque na grande imprensa do que as colocações muito pertinentes que fez o líder venezuelano a respeito da deplorável situação da ordem jurídica internacional. Contudo, a parte substancial da fala não passou despercebida dentre os desesperançados de todo o mundo.
O discurso do presidente Chávez desnudou problemas e verdades que devem receber a atenção da comunidade internacional, sob pena de termos o fortalecimento da tirania e do arbítrio, em detrimento do regime do império da lei nas relações internacionais.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).