Sob o título “Criminosos da era eletrônica”, em artigo publicado em Gazeta Mercantil de 25 de agosto, o professor Dalmo de Abreu Dallari comentou um caso sob os meus cuidados profissionais, ou seja, a ação que o Ministério Público Federal move contra a empresa Google Brasil. A matéria diz respeito à cooperação na prestação de informações referentes à prática dos crimes eletrônicos.
A questão é complexa e tem um forte matiz internacional. De fato, no crime eletrônico é freqüente o criminoso estar num país, a vítima noutro, o computador num terceiro e o servidor numa quarta jurisdição. A natureza do cibercrime, bem como a própria estrutura da rede mundial de computadores, levou a comunidade internacional a celebrar, em 2001, a Convenção sobre o Cibercrime, assinada por 42 países, mas não pelo Brasil.
A convenção procura lidar com os crimes praticados por computador. Esses ocorrem, em primeiro lugar, quando um computador é objeto de um crime, como no caso da subtração ilegal de informações ou dano a equipamento ou rede. Por outro lado, um computador pode ser usado para cometer um delito, via Internet (…). Em terceiro lugar, um computador guarda provas, que podem constituir a materialidade de um crime (…).
Essa última categoria faz-se necessária porque, como é sabido, no direito doméstico vale o princípio de que a lei do local rege o ato (lex loci regit actus). (…). O caso que ensejou o comentário do professor Abreu Dallari foi iniciado há cerca de três meses por uma série de entrevistas, individuais e coletivas, nas quais o Ministério Público comunicou sua intenção de processar a Google Brasil por falta de cooperação. Em seguida, no último dia 22 de agosto, o Ministério Público divulgou um comunicado à imprensa (sic) informando haver distribuído uma ação contra a Google Brasil, requerendo multas e até mesmo o “fechamento” da empresa (sic). A empresa ré ainda não foi citada, portanto ainda não contestou a ação.
Dentre as alegações infundadas utilizadas pelo Ministério Público Federal está a de que não tem recebido cooperação em revelar a identidade dos criminosos, o que foi utilizado como uma premissa básica para o raciocínio do prof. Abreu Dallari. Em realidade, a empresa que detém as informações é a Google Inc., em servidores situados nos Estados Unidos da América, sujeitos portanto às leis daquele país. Contudo, a Google Inc. tem prestado informações e colaboração em todos os pedidos a ela dirigidos pelo Judiciário (…).
Para demonstrar a pertinência de suas alegações técnicas, a Google Brasil antecipou-se ao Ministério Público Federal no dia 21 de agosto tendo entrado com uma produção antecipada de provas na qual demonstrará que não tem os servidores Orkut e não tem acesso aos dados ali armazenados.
De resto, a questão está sub judice.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).