Apenas nos primeiros três meses de 2007, o real apreciou-se contra o dólar norte-americano nada menos que 5,24%. Nos últimos dois anos, das 66 moedas monitoradas pelo serviço Bloomberg, o real foi aquela que mais se apreciou contra o dólar.

Essa valorização desmesurada está, por si própria, a tirar a competitividade internacional da indústria brasileira. Aliada, à carga tributária excessiva, à burocracia ensandecida, à incompetência do setor público e aos mais elevados juros praticados no mundo, a valorização da moeda contribui para o acelerado processo de desindustrialização do Brasil.

Pouco a pouco, o país deixa de ser plataforma de exportação, por perda da competitividade, e suas próprias indústrias estão a se transferir para países com políticas macroeconômicas mais confiáveis para atender ao próprio mercado interno brasileiro.

Acresce que as notícias sobre o andamento das negociações comerciais externas brasileiras não trazem nem bons augúrios, nem bons prognósticos para o setor industrial brasileiro.

No âmbito multilateral, na importante defesa dos interesses do nosso setor agrícola, que representa cerca de 18% do PIB do Brasil, segundo a nova metodologia do IBGE, o governo parece pronto a entregar o setor industrial, que tem o mesmo peso, e o setor de serviços, que responde a 64% do PIB, aos concorrentes estrangeiros.

Por sua vez, no âmbito regional, nosso governo já propôs a redução dos critérios de regras de origem no Mercosul, com o intuito de oficializar o contrabando e o descaminho, sob o pretexto de colaborar com o crescimento das economias menores do bloco.

Como se a fraude tarifária, ainda que oficializada, ao permitir a importação triangulada de produtos extra-bloco, pudesse promover o desenvolvimento econômico. Nesse particular, fomos salvos, até o momento, pelo bom-senso do governo Kirchner (sic), que não acolheu a bizarra iniciativa brasileira.

Pois bem, no Brasil tem-se procurado explicar a valorização desmedida do real, não pela incompetência estratégica absoluta do Banco Central do Brasil, mas sim por uma fatalidade cruel decorrente do sucesso do desempenho comercial do país, que acumulou um saldo comercial positivo de aproximadamente US$ 45 bilhões nos últimos 12 meses.

Segundo os defensores da bizarra política monetária brasileira, que conseguem convencer a muitos, o volume do saldo comercial brasileiro seria a inexorável desventura responsável pela apreciação relativa do valor de nossa moeda. É absolutamente falso e desonesto o argumento.

A apreciação do real é causada pela política da taxa de juros reais de 8,75%, os mais elevados do planeta, e pelos incentivos fiscais ao ingresso de capitais financeiros especulativos internacionais em nosso país, o que beneficia o setor financeiro doméstico e internacional, mas prejudica a economia real.

Fossem corretos os argumentos dos defensores do capital internacional, insertos no governo brasileiro, de que os grandes saldos comerciais apreciam as moedas, o mesmo fenômeno ocorreria em outros países com balanças comerciais muito favoráveis. O Japão, por exemplo, teve um saldo comercial de US$ 84 bilhões nos últimos 12 meses. O yen estava a 117 contra o dólar há um ano e está a 119 hoje. Sua taxa de juros real é de 0,38% ao ano.

Por outro lado, a China teve um superávit de US$ 204 bilhões no igual período. Sua moeda estava a 8,02 há um ano e está a 7,77 hoje. Sua taxa de juros real está por volta de 2% ao ano. Por sua vez, o Canadá teve um saldo comercial quase idêntico ao brasileiro, no valor de US$ 47,4 bilhões. Sua moeda estava a 1,17 há um ano e está a 1,16 hoje. Sua taxa real de juros também está por volta de 2% ao ano.

Fora da zona do Euro e da União Européia, Noruega teve um superávit superior ao brasileiro, no montante de US$ 55,4 bilhões de dólares. Sua moeda estava a 6,43 há um ano e está a 6,11 hoje. Sua taxa real de juros está abaixo de 3%. Na União Européia, a Alemanha teve um saldo comercial de US$ 209 bilhões. O euro esteve a 0,82 há um ano e está a 0,75 hoje. Sua taxa de juros real é de cerca de 2,1% ao ano.

Próximo ao Brasil, o Chile teve um superávit comercial de US$ 24,4 bilhões nos últimos 12 meses o que, proporcionalmente ao seu PIB, é superior ao brasileiro. Pois bem, sua moeda estava a 521 há um ano e está a 537 hoje. Sua taxa real de juros é de aproximadamente 2,4% ao ano. Outros países, como Cingapura, Indonésia e Arábia Saudita apresentam situações assemelhadas. Somente o Brasil difere.

Comprovada a falácia dos argumentos oficiais brasileiros a respeito da causa da supervalorização do real, resta superar a percepção, igualmente desacertada, de que a estabilidade da política monetária somente se obtém com uma política radical de juros exacerbados. A eficiência na gestão pública atinge o mesmo efeito, sem os efeitos colaterais perversos.

Da mesma forma, nas negociações comerciais internacionais, a agenda afirmativa do Brasil deve compreender a integridade dos interesses nacionais e não os de uns poucos, em detrimentos dos demais, majoritários.