Mais uma vez o famigerado escândalo da compra de votos de parlamentares ou “esquema do mensalão”, como já ficou apelidado, é figurado nas manchetes dos principais jornais e noticiários do Brasil e do Exterior (nos países latino-americanos, a questão foi tratada como “mensalón”; nos países de língua inglesa como “big monthly allowance” – grande pagamento mensal – e como “vote-buying” – compra de votos).

A diferença é que, desta vez, os holofotes atentos da imprensa voltam-se para a instância máxima do Poder Judiciário, localizada em Brasília. Isto porque faz pouco, mais especificamente no dia 9 de novembro, foi apreciada questão de ordem pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), onde se decidiu pelo desmembramento do inquérito (INQ n.º 2245) que investiga o “suposto” escândalo mensaleiro.

Nesse contexto, ficou decidido que todos os denunciados detentores de foro privilegiado e outros que tenham supostamente cometido crimes em co-autoria, serão processados e julgados pelo STF. Como visto, não vingou a proposta do relator, ministro Joaquim Barbosa, de remeter à primeira instância todos os denunciados que não detêm prerrogativa de foro.

O julgamento foi tomado conforme três linhas de interpretação:

1) o do ministro Joaquim Barbosa, que queria manter no STF apenas os processos daqueles que têm prerrogativa de foro;

2) a manutenção das investigações contra os 40 denunciados na Corte, proposta pela recém-empossada ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha; e

3) a solução proposta pelo ministro Sepúlveda Pertence – classificada de “voto médio” – de manter no STF apenas os denunciados que detêm foro privilegiado, junto com os seus co-autores, sendo o entendimento que preponderou.

Cabe enfatizar que o aludido “voto médio” do decano do STF baseou-se, precipuamente, segundo afirmou, na convicção de que, diante da “complexidade da denúncia e da multidão” de acusados, não estava preocupado com o artigo 80 do Código de Processo Penal (CPP), citado pelo relator e que diz respeito ao desmembramento dos processos, mas sim com o artigo 580 do mesmo estatuto, o qual se funda no aproveitamento dos atos processuais, em havendo concurso de agentes.

Dessa forma, os onze ministros reunidos decidiram que ficará a cargo do relator do caso, que a partir de então funcionará como um verdadeiro “delegado” do STF, submeter proposta de desmembramento concorde com o sistema sugerido pelo ministro Sepúlveda Pertence.

Como visto, o caso é complexo e de difícil compreensão, até mesmo para os que trilham os caminhos do Direito.

Por esses motivos e em respeito àqueles que, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda permanecem intocavelmente adormecidos e alienados dos acontecimentos nacionais, farei alguns breves comentários sobre o ocorrido.

Em abril do ano passado, o Ministério Público Federal denunciou 40 pessoas acusadas de envolvimento no esquema de compra de votos de parlamentares, objetivando que tais congressistas votassem projetos alinhados aos interesses do Poder Executivo. Entre os denunciados estão os ex-ministros José Dirceu e Luiz Gushiken, os ex-dirigentes do Partido dos Trabalhadores (PT) José Genoíno, Delúbio Soares e Sílvio Pereira, o empresário Marcos Valério, os publicitários Duda Mendonça e sua sócia Zilmar Fernandes. Também são acusados de participação no esquema os parlamentares João Paulo Cunha, José Janene, Pedro Henry, José Borba e Professor Luizinho. Muitos deles são acusados em mais de seis crimes, entre eles, os de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, evasão ilegal de divisas, corrupção ativa e passiva e peculato.

Segundo a investigação do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, o esquema do mensalão era mantido por uma “organização criminosa” dividida em três núcleos: o político-partidário, o publicitário e o financeiro. Para garantir apoio no Congresso, ajudar na eleição de aliados e fazer caixa para novas campanhas, o estado-maior do PT desembolsava altas quantias, aparentemente recebidas em troca de favorecimento da máquina pública.

Como puderam perceber, as cartas foram postas na mesa, os participantes começaram a atuar e a sorte foi lançada. Porém, não se animem tanto, pois, como afirmado pelo próprio relator do caso, o inquérito está longe de ser concluído. E pior, ainda não se tem certeza sobre o ingresso de uma ação penal contra os 40 denunciados.

Por isso, façam suas preces e torçam muito para que este incidente não acabe como os outros (ainda piores) que presenciamos costumeiramente em nosso país do “faz de conta”.

O desmembramento do inquérito do mensalão:
texto extraído da coluna trimestral DE OLHO NO JUDICIÁRIO do jornal PARLATÓRIO