A Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) foi lançada em novembro de 2001, durante a 4ª Conferência Ministerial do organismo multilateral, na capital do Qatar. O seu objetivo declarado foi o da promoção do desenvolvimento econômico mediante a liberalização e expansão do comércio mundial.
Tal agenda se fez importante para estancar a perda de credibilidade da OMC, gerada pela percepção de que a instituição promovia a prosperidade seletiva de uns poucos, os países desenvolvidos, em detrimento dos muitos, os países em desenvolvimento.
De fato, estudos de responsabilidades de outras agências multilaterais davam conta que cerca de 80% dos benefícios da criação da OMC, resultado da Rodada Uruguai do GATT couberam aos países desenvolvidos, contra 20% para os países em desenvolvimento, em dramático desequilíbrio inverso da relação dos benefícios com a população.
Durante as negociações da Rodada Uruguai houve, pela primeira vez na história do GATT, esforços de resistência à fúria predatória dos países desenvolvidos, da parte dos países em desenvolvimento aglutinados no chamado Grupo dos 11, então liderado por Brasil e Índia.
Pois bem, quando da 5ª. Reunião Ministerial da OMC, em Cancun, México, emergiu a clara necessidade da formação de um novo agrupamento dentre os países membros do organismo multilateral para, ao afirmar o elo entre a agricultura e o desenvolvimento, patrocinar os interesses dos produtores agrícolas dentre as economias emergentes.
O G20 (Grupo dos 20) é composto de países da África (África do Sul, Egito, Nigéria, Tanzânia e Zimbábue), Ásia (China, Filipinas, Índia, Indonésia, Paquistão e Tailândia) e América Latina ( Brasil, Argentina, Bolívia, Chile, Cuba, Equador, Guatemala, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela), que representam cerca de 20% da produção agrícola e 63% da população rural mundial.
Deve-se reconhecer que, até o presente momento, o G20 tem tenazmente defendido os interesses do bloco negociador e, mesmo contra a previsão de muitos e, apesar dos esforços de desestabilização movidos pelos tradicionais grupos de pressão dos países desenvolvidos, está coeso.
Por outro lado, contudo, observe-se que o leque de abrangência dos interesses comuns é bem menor do que aquele objeto da agenda do Grupo dos 11. Da mesma forma, a magnitude do desastroso resultado da Rodada Uruguai, com seus graves desequilíbrios recomenda um grande esforço de correção dos malefícios então incorporados nos Tratados de Marraqueche.
Assim, é preocupante a concentração da resistência dos países em desenvolvimento apenas nos temas agrícolas, quando fazem parte das negociações outras áreas de grande interesse como serviços, acesso a mercados, propriedade intelectual, medidas de investimento, concorrência, compras governamentais, facilitação, regras, resolução de disputas, meio ambiente e comércio eletrônico.
Dessa maneira, o resultado da Rodada Doha, se concluída, poderá ser novamente nefasto para as economias emergentes e, mais do que isto, perpetuar a insana lógica da OMC.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).