São Paulo – Com o típico alarde e retumbante repercussão, a agência de crédito Fitch anunciou o rebaixamento do risco de crédito soberano de Portugal no dia 24 de março de 2010, de AA para AA menos, causando uma queda expressiva da cotação do Euro nos mercados internacionais e o aumento do custo para os empréstimos a serem tomados por aquele país. Contudo, Portugal continua a ser avaliado dentro dos patamares do chamado “grau de investimento”, que estão situados, no caso da Fitch, de AAA até BBB e suas variações.
De fato, a economia portuguesa debate-se diante de severos desafios. O crescimento do ano passado foi negativo em um por cento e, para 2010, espera-se que seja positivo apenas marginalmente. De maneira mais significativa, a condição macroeconômica do país apresenta-se precária, pois o déficit orçamentário chegou a 9,3% do PIB (Produto Interno Bruto), quando o critério da zona do Euro, estabelecido pelo Tratado de Maastricht determina o máximo de 3%.
Para fazer frente à situação, governo socialista português apresentou, no início de março deste ano, um projeto de orçamento com o objetivo de redução do déficit para o patamar de 8% no próximo exercício, o que é positivo, mas não é decisivo para uma avaliação mais otimista das perspectivas econômicas do país.
Acresce que Portugal paga hoje o preço de haver mal negociado a acessão às comunidades européias, hoje União Européia, abrindo mão de setores potencialmente competitivos de sua economia, numa perspectiva estratégica, pelos ilusórios fundos comunitários de ajuda econômica, de efeito apenas de curto prazo. As condições geográficas de Portugal são ainda limitantes, como é sabido.
Contudo, comparativamente, a situação portuguesa apresenta-se muito superior àquela do Reino Unido, que manteve sua classificação na referida agência no patamar AAA, apesar de anunciar um déficit orçamentário de ordem de 13% do PIB do país. A economia inglesa teve um crescimento negativo de 5% em 2009, sua indústria encontra-se sucateada e o seu outrora viçoso sistema financeiro encontra-se vivo graças aos subsídios governamentais no valor de aproximadamente metade do PIB britânico!
Por outro lado, o Brasil, com um déficit orçamentário de apenas 3% de seu PIB, coisa rara nos dias de hoje, e com uma das economias mais ricas e ativas do mundo tem uma avaliação de crédito pela agência Fitch de apenas BBB menos, inferior até mesmo àquela do México. Prognósticos independentes de alta credibilidade apontam para um crescimento econômico brasileiro de, pelo menos, 5% em 2010, e a superação da economia britânica neste ano.
Essas não são inconsistências únicas no trabalho da Fitch e bem assim de outras agências de avaliação de risco, marcadas pelo etnocentrismo e por vínculos pouco transparentes com certas forças dos mercados financeiros, que elas deveriam analisar de maneira isenta e independente.
É oportuno lembrar que, no dia 11 de setembro de 2008, quando o banco de investimento Lehman Brothers se tornou insolvente e anunciou perdas de US$ 4 bilhões, a Fitch avaliava a referida instituição com o alto nível de A mais, mudando sua apreciação apenas depois da admissão da quebra, no dia 15 de setembro.
Não é sem propósito que, dentro do esforço para regulamentar de maneira mais eficaz os mercados financeiros, clama-se por um maior controle e regras mais rígidas de atuação das agências de avaliação de risco, de maneira a se evitar que induzam os investidores ao risco, pela incompetência ou pela má-fé.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).