Publicado no sítio eletrônico Valor Econômico, São Paulo, 12 de abril de 2018.
Apesar do cenário econômico desfavorável dos últimos anos no Brasil, as fintechs, empresas de tecnologia do mercado financeiro, não param de atrair investimentos nacionais e estrangeiros. De acordo com o “Conexão Fintech”, portal eletrônico de notícias, em 2016 as fintechs brasileiras receberam cerca de R$ 515 milhões (US$ 161 milhões) em investimentos; em 2017 foram R$ 457 (US$ 142 milhões); em 2018 considerando o investimento recebido pelo Nubank, fintech brasileira, o valor já está em R$ 760 milhões (US$ 237 milhões), isso apenas em janeiro e fevereiro de 2018.
Estas empresas que unem as duas maiores indústrias do mundo, a indústria financeira e a tecnologia, através da inovação vêm proporcionando aos consumidores serviços e produtos financeiros simplificados e com custos baixos se comparados com os do mercado financeiro brasileiro.
Além do interesse dos consumidores, os investidores também são atraídos pelas fintechs brasileiras porque no Brasil 53% das médias e pequenas empresas não têm acesso a crédito; 32% da população adulta não têm conta em banco, mas já têm acesso à internet via telefone celular ou via cybercafés; e, principalmente porque, no Brasil é possível praticar spreads bancários muito superiores aos praticados na Europa e nos Estados Unidos.
De acordo com o Radar FintechLab, um portal eletrônico de notícias, as fintechs brasileiras operam hoje em nove segmentos distintos e altamente regulamentados. São eles: pagamentos; gestão financeira; empréstimos; investimentos; financiamento; seguros; negociação de dívidas; criptomoedas e câmbio.
Ainda não há consenso no Brasil ou no exterior sobre como as fintechs deverão ser regulamentadas. Aqui no Brasil, o BC e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) vêm acompanhando, de perto, o desenvolvimento destas empresas tecnológicas. O BC, em setembro de 2017, publicou edital de consulta pública dispondo sobre o funcionamento de duas espécies de fintechs: sociedade de crédito direto e sociedade de empréstimo entre pessoas.
A CVM comunicou em novembro de 2017 estudos sobre a viabilidade de implantação de um projeto regulatório nos mercados de capitais, de seguros e previdência. O mencionado projeto regulatório anunciado pela CVM já está sendo desenvolvido há mais de dois anos no exterior e é conhecido como “Sandbox”.
O “Sandbox” ou “caixa de areia”, na tradução literal para o idioma português, é um termo utilizado na ciência da computação, quando se quer isolar a execução de um programa dentro de um espaço virtual delimitado e neutro, tornando possível testar as suas operações em um ambiente fechado para assim proteger o restante do sistema operacional do computador. Noutras palavras, o “Sandbox” é uma forma eficaz de testar novos microssistemas sem comprometer o sistema como um todo.
A validação para operar via “Sandbox” regulatório auxiliará as fintechs a terem acesso a novos financiamentos
No caso do “Sandbox” regulatório, ele tem como objetivo testar e isolar a execução de uma determinada fintech que poderá levar novos projetos e realizar suas atividades com autorização provisória dentro de um espaço virtual neutro, previamente delimitado e sob monitoramento do órgão regular.
O “Sandbox” regulatório visa a proteção dos consumidores e do sistema financeiro, além de testar o funcionamento e avaliar os benefícios que os novos produtos financeiros poderiam trazer ao mercado e ao consumidor.
No Reino Unido, o regime regulatório “Sandbox” foi proposto em novembro de 2015 pela FCA (“Financial Conduct Authority”), órgão regulador do mercado financeiro britânico, e desde então está em desenvolvimento.
Para que as fintechs possam se beneficiar do regime regulatório “Sandbox” perante a FCA, certos critérios deverão ser observados, são eles: inovação genuína; benefício direto ou indireto ao consumidor e deverá haver real necessidade para utilizar o sistema do “Sandbox”, ou seja, a inovação não se encaixa no quadro normativo regulatório já existente.
O “Sandbox” regulatório permite que as empresas testem serviços, produtos e modelos de negócios inovadores num ambiente de mercado real com interação com consumidores e bancos sob a supervisão da autoridade reguladora, a qual em conjunto com as fintechs verificará eventuais medidas preventivas apropriadas para a proteção dos consumidores e do sistema financeiro.
São muitos os benefícios a serem verificados com a implementação do “Sandbox” regulatório no Brasil, entre eles: 1-permitir que o órgão regulador trabalhe próximo as fintechs para compreender melhor o mercado e garantir que proteções adequadas ao consumidor sejam incorporadas aos novos produtos e serviços; 2- permitir que mais produtos sejam previamente testados e, assim, garantir que sejam disponibilizados produtos ao mercado em conformidade regulatória; 3- reduzir o tempo e, potencialmente, o custo de colocar ideias inovadoras no mercado; e 4- viabilizar maior acesso ao financiamento para os inovadores, vez que a redução de incerteza regulatória atrai investimentos.
Assim, além de salvaguardar os consumidores e o mercado, a obtenção ou validação perante o órgão regulador para operar via “Sandbox” regulatório, auxiliará as fintechs a darem mais segurança aos possíveis parceiros, bem como a terem acesso a novos financiamentos. Sem dúvidas, são significativos os benefícios a serem verificados pelo mercado e pelos consumidores com a implementação deste projeto inovador no Brasil.
Sócio de Noronha Advogados, no departamento Bancário e Securitário, especializado em “International Investment Law” pelo King’s College London e em Estruturas e Operações Empresariais pela FGV-Direito.