Ao que tudo indica, 2008 será o ano em que o Ministério do Comércio da República Popular China oferecerá ao investidor estrangeiro uma nova (e interessante) possibilidade de estrutura empresarial na China continental.
Se há sete anos o investidor estrangeiro interessado em entrar no mercado chinês encontrava apenas duas restritas opções de organização empresarial – uma joint venture local ("JV") e um escritório de representação – representative office ("RO") –, a necessidade de adequação às regras de acesso ao mercado, como requisito para entrada da China na Organização Mundial de Comércio ("OMC"), resultou na promulgação, em abril de 2001, da regulamentação específica da lei que permite o estabelecimento de empresa de propriedade inteiramente estrangeira – wholly-owned foreign enterprise ("WFOE") –, marcando na época uma importante alternativa de organização empresarial estrangeira na China.
Recentemente considerada como a quarta categoria de investimento estrangeiro na China, não surpreende a grande repercussão causada pela divulgação do Projeto de Lei que dispõe sobre a Administracão de Sociedades com Investimento Direto Estrangeiro (FIPL – Foreign Invested Partnerships).
A divulgação, feita pelo Ministério do Comércio da China em janeiro deste ano, circula entre as agências governamentais para eventuais comentários e tem como objetivo atender à necessidade de regulamentação do atual Artigo 108 da Lei de Sociedades, de 27 de agosto de 2006, que dispõe sobre sociedades empresariais de investimento estrangeiro (FIEs – Foreign Invested Enterprises).
O Projeto de lei, ainda sujeito à aprovação do Congresso e composto por 38 artigos distribuídos em 4 capítulos, contém as provisões gerais aplicáveis a uma FIE, registro e estabelecimento, impostos, administração e troca de moeda estrangeira, entre outros. A seguir, um resumo geral das mudanças significativas introduzidas pelo projeto de lei que regulamenta as novas FIPL em questão:
• A nova modalidade admite como sócios tanto pessoas físicas como jurídicas – ao contrário da legislação aplicável à JV na China, que só admite como acionistas pessoas jurídicas, sendo uma delas necessariamente de origem chinesa. Neste sentido, o artigo 2º do Projeto de Lei permite ao novo formato de FIE ter em seu quadro de sócios tanto pessoas físicas como jurídicas, admitindo que a sociedade seja formada por qualquer combinação de indivíduos, empresas ou organizações, estrangeiras ou chinesas. Além disso, permite a empresa matriz e sua subsidiária chinesa formarem uma sociedade.
• Imposto de renda – a atual taxação das empresas estrangeiras na China implica, geralmente, em dupla taxação uma vez que a empresa paga tanto imposto sobre seus rendimentos (enterprise income tax) quanto sobre os dividendos pagos aos seus acionistas individualmente (individual income tax). No projeto de lei relativo à FIPL, o imposto de renda só incidirá individualmente sobre a distribuição de dividendos aos acionistas.
• O capital social – segundo o artigo 11 do projeto, investidores estrangeiros numa FIPL devem realizar a contribuição do capital registrado dentro de 90 (noventa) dias contados da data de aprovação da sociedade.
• Obrigações dos sócios – o projeto em questão, artigos 21 e 25, exige que sócios estrangeiros de responsabilidade geral submetam às autoridades chinesas uma lista de suas propriedades para aprovação e registro. Ademais, exige que referida lista seja atualizada sempre que houver modificações relevantes em relação às mencionadas propriedades.
• Note-se que, de acordo com o Projeto de Lei, uma empresa estatal não poderá ser sócia geral em uma FIPL. Destarte, a previsão é de que a nova forma de investimento fique restrita ao setor de economia privada.
• Há o receio de que as novas regras possam ser incompatíveis com o típico modo de operação de fundos de participação em empresas estrangeiras (private equity funds). Um exemplo disto poderia ser a norma de que o investidor estrangeiro há de contribuir 100% do capital em 90 dias depois da aprovação da sociedade.
• Estas incertezas levam à avaliação de que o impacto imediato sobre os investimentos desse tipo possa ser negligível (Morrison & Foerster). Porém, a avaliação é de que, mesmo se a minuta não for alterada, a lei é um "passo na direção certa".
• Por outro lado, segundo a avaliação de Faegre & Benson, a aprovação da minuta resultará numa maior abertura do mercado de serviços da China. Um obstáculo, porém, poderá estar no complicado processo de aprovação de novas FIPLs.
Segundo a Klako Group, o novo tipo de investimento flexibilizará os investimentos na China e por isso terá que ser levado em conhecimento.
No que se refere ao sistema de aprovação, documentos necessários e possíveis áreas de atuação, de acordo com a redação do projeto de lei divulgada, aplicar-se-ão as atuais regras relativas à aprovação de sociedades estrangeiras ou com participação de capital estrangeiro.
Apesar da exitência de pontos obscuros no projeto de lei divulgado, as opiniões dos especialistas convergem em considerar a nova regulamentação um importante passo para uma Lei de Sociedade pró-investimento empresarial estrangeiro, sobretudo considerando pequenas e médias empresas, que atualmente não têm condições de arcar com os elevados custos requeridos para o estabelecimento de uma JV ou uma WFOE na China.
Considerando que ao longo do ano de 2007 referido esboço foi objeto de difundida análise e aperfeiçoamento, a expectativa é de que a Lei definitiva seja aprovada e entre em vigor já em 2008.
Gustavo Rabello é advogado Diretor do Escritório Noronha Advogados em Xangai, China.
Fernanda Lomenso é advogada do Escritório Noronha Advogados em Xangai, China.