A UE (União Européia) divulgou, na semana passada, em Bruxelas, através do seu órgão de alimentos e de veterinária, o Food and Veterinary Office, uma série de medidas restritivas de caráter fito-sanitário à exportação da carne bovina brasileira.
Tratam-se, na realidade de barreiras não tarifárias sem fundamentação legal face à ordem jurídica multilateral da OMC (Organização Mundial do Comércio) e destinadas a proteger o setor produtivo interno do bloco composto de 27 países.
É sobejamente sabido que a UE tem a sua principal razão de ser fundada no protecionismo agrícola. Seu infame PAC (Programa Agrícola Comum) tem recebido historicamente quase dois terços do orçamento do bloco. Com tantos recursos a financiar artificialmente uma competitividade irremediavelmente perdida, o PAC promove a miséria e a desesperança numa escala global, condenando os países em desenvolvimento à posição de eternos perdedores no jogo do comércio internacional.
Assim, o PAC demonstra claramente que o discurso de livre comércio praticado pela UE é apenas uma falsa retórica para dissimular seu desbragado protecionismo e sua política de promoção da prosperidade seletiva de uns poucos, os europeus, em detrimento dos muitos, os demais. Como os Estados Unidos da América reagem à PAC com subsídios próprios, os efeitos deletérios globais são ainda maiores.
De acordo com o novo regulamento fito-sanitário europeu, o governo brasileiro será o encarregado de supervisionar a observância das normas européias, tanto preconceituosas como ilegais, pelos produtores brasileiros (sic). Tais normas aplicam critérios seletivos regionais e técnicos para limitar as exportações do Brasil destinadas aos mercados internos da UE.
Estimaa-se que apenas 300 propriedades, no Brasil, estarão aptas a obter a certificação de exportadoras para a Europa.
Como conseqüência, as exportações brasileiras para a UE deverão cair para menos da metade dos volumes atuais. O impacto será grande para o consumidor europeu que pagará mais por um produto de qualidade muito inferior ao brasileiro, que é reconhecido como superior hoje até mesmo pelos argentinos.
Mais uma vez fracassou o Itamaraty em negociações internacionais que, nesse caso, vêm sido conduzidas há cerca de dois anos. Em primeiro lugar, os negociadores brasileiros aceitaram que, sob o pretexto de falsos princípios fito-sanitários seja promovida uma tanto injustificável quanto arbitrária discriminação entre os países, para favorecimento dos produtores domésticos.
Segue-se que a sopitada diplomacia brasileira aceitou ainda fazer do próprio governo do País um instrumento de fiscalização das normas européias. Incompetência à parte, o Itamaraty vem igualmente se mostrando insensível às questões e interesses privados da economia brasileira e ignora que mais de 70% do Produto Interno Bruto do Brasil é composto pelo setor privado.
Se a diplomacia européia tivesse aceitado placidamente tamanha discriminação insustentável juridicamente, uma grande crise política seria armada no seio da UE. No Brasil, provavelmente o chanceler dará mais uma entrevista coletiva alardeando o mais novo “sucesso” e a retumbante “vitória” da diplomacia do Itamaraty.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).