Publicada em 26-01-2010
Segundo estimativas do Ministério da Justiça reveladas há poucos dias, cerca de 44 mil imigrantes apresentaram-se para o cadastramento e regularização contemplados pela Lei 1664, sancionada pelo presidente Lula em julho de 2009, permitida para os imigrantes ilegais que entraram no País até o dia 1 de fevereiro de 2009. Iniciativas semelhantes, que honram a tradição brasileira de acolhimento aos imigrantes, já haviam sido levadas a efeito em 1998 e 1988.

Desse grupo, o maior contingente, de aproximadamente 17 mil pessoas, é composto de bolivianos, seguidos pelos chineses (6 mil), paraguaios (5 mil) e europeus (sic), com cerca de 3 mil indivíduos. Ao fazer o cadastramento, para o qual foi necessária a comprovação da data de entrada, os imigrantes receberam o visto de residência provisório e, doravante, poderão requerer a cidadania permanente.

A regularização da situação jurídica dos imigrantes é importante porque atende aos mais fundamentais requisitos de direitos humanos, já que impede que sejam vítimas de abusos na área do trabalho, evita a submissão a manifestações mais graves de discriminação, além do que permite a integração produtiva de tais indivíduos em nossa sociedade e economia.

Alhures, a situação apresenta-se bem diversa. No chamado mundo desenvolvido, profundamente atingido pelos efeitos da crise econômica e financeira, prevalece uma situação de histeria generalizada contra o imigrante alimentada pelo racismo e pela xenofobia. Essa reação adversa vem de partidos políticos, de setores generalizados da população, bem como dos próprios governos.

Na Europa, por exemplo, a situação apresenta-se crítica. O Reino Unido, que nos últimos anos passou a receber imigrantes de diversas partes do mundo, mas principalmente dos países que fizeram parte do defunto Império Britânico, adota medidas tanto rigorosas quanto indignas de controle de imigração. Essas providências ultrajantes começam nos controles dos aeroportos e seguem no quotidiano local.

Descontente com os severos limites atuais, o Partido Conservador apresenta na sua plataforma para as próximas eleições uma proposta de enrijecimento do tratamento dos imigrantes, com limitações inclusive para o acesso ao país com a finalidade do aprendizado da língua inglesa, um dos principais campos de atividade econômica no setor de serviços.

Na Itália do governo Berlusconi, de nítida inspiração fascista, de norte a sul é promovida a caça aos imigrantes. No Veneto e no Piemonte, bandos de vigilantes encorajados pelas autoridades constituídas, agridem imigrantes legais e ilegais e mais todos aqueles com aparência física julgada exótica, em profunda demonstração de racismo institucionalizado.

No sul, na Calábria, onde os imigrantes legais vivem em condições de degradação desconhecidas nas piores favelas brasileiras e indianas, devem ainda aturar ataques armados por parte dos cidadãos instigados por um governo irresponsável, que lhes atribui a culpa pela perda de empregos, dentre outras alegações disparatadas.

Noutros países europeus a situação, embora não tão dramática, permanece ruim. ? certo que a questão da imigração ilegal é um grave problema, mas o seu tratamento pelas autoridades constituídas não deve perder de vista a observância dos direitos humanos das pessoas e famílias envolvidas.

De mais a mais, sempre vale a pena lembrar que a imigração ilegal de hoje tem um fundo predominantemente econômico e resulta das tradicionais assimetrias de desenvolvimento econômico favorecidas pelos países chamados desenvolvidos, para assegurar a própria prosperidade, ainda que o custo seja a miséria dos demais.

* Sócio sênior de Noronha Advogados, especialista em Direito Internacional e árbitro da Comissão Internacional de Arbitragem Comercial da China (CIETAC), GATT e OMC
DURVAL DE NORONHA GOYOS *