Londres – As potencias ocidentais tem tradicionalmente uma postura hipócrita com relação aos grandes temas do direito internacional como, de um lado, o discurso santimônico a respeito aos direitos humanos, a proteção às populações civis, o combate à corrupção, a luta contra a lavagem de dinheiro e o embate contra o crime organizado e, de outro, os interesses pragmáticos de seus agentes privados e sanguinários governos.

A atual crise na Líbia mais uma vez demonstrou a veracidade de tal fenômeno. De fato, um relatório publicado em Londres no dia 5 de abril de 2011, dá conta que o governo britânico até a bem pouco tempo atrás, ainda no corrente ano, tinha licenças de exportação de armamentos em vigor para paises como a Líbia, o Egito, a Tunísia e Bahrein.

Tais armamentos incluíam itens diversos como o gás lacrimogêneo, armas de pequeno porte, metralhadoras, vários instrumentos de controle de multidão, petrechos utilizáveis na tortura, para alem de outros de uso corrente na repressão das populações civis mundo afora.

Da mesma forma, as potencias ocidentais geriam os recursos financeiros da ditadura líbia e de seus agentes até a Resolução 1970 da ONU, de 26 de fevereiro de 2011, adotada por unanimidade e que trata da preservação dos direitos humanos das populações civis da Líbia.

Em marco do mesmo ano, diversos governos ocidentais, até então íntimos parceiros do regime líbio, decretaram o congelamento dos recursos do regime e de seus principais lideres, incluindo os de Muamar Gaddafi. É difícil precisar o montante de tais enormes investimentos mantidos no sistema bancário ocidental.

Apenas nos Estados Unidos da América, foram congelados US$ 32 bilhões. Na Alemanha, foram bloqueados € 10 bilhões em 193 contas diversas mantidas em 14 bancos, incluído o Bundesbank. No Reino Unido, o regime de Gaddafi tem mais de £ 20 bilhões de recursos líquidos, fora investimentos expressivos em organizações como o banco HSBC, o controlador do jornal Financial Times e ate mesmo na London School of Economics (LSE).

Na Itália, o regime líbio e seus operadores possuem um montante estimado em cerca de € 10 bilhões, compreendendo investimentos na FIAT, na UNICREDIT, na ENI e até mesmo na Juventus Football Club de Turim. Tudo isso sem contar contribuições de monta para partidos da coligação bufa, caricata e criminosa que mantém Berlusconi, o sátiro debochado, no poder.

Ora, não é de se perguntar como um ditador notoriamente corrupto e sanguinário como Gaddafi possa abrir contas pessoais para si, suas estruturas societárias pessoais e familiares, em paises que tem leis de combate à corrupção, ao crime organizado, à lavagem de dinheiro, e bancos que fazem a auditoria legal de seus clientes para se assegurar da conformidade àquelas leis?

Com o regime líbio em crise, começou a corrida para que os agentes imorais das potências ocidentais, tanto públicos como privados, se apropriem dos recursos subtraídos do povo líbio e que a ele pertencem. Usam, para tanto, argumentos dos mais diversos, todos eles dissociados de sua ação pregressa.

É em situações pouco edificantes como essa que se verifica a necessidade de uma nova ordem internacional e de um regime mais eficaz no âmago da ONU.