1.- A alta volatilidade presente no mundo globalizado traz dificuldades tanto no mundo dos negócios quanto para palestrantes em eventos como este. Este texto foi apresentado ao organizadores no início de outubro, quando o Supremo Tribunal decidiu[1]
unanimemente que a legislação à respeito da redução das contribuições sociais para os trabalhadores do setor público, e pagamento de contribuições pelos já aposentados, eram inconstitucionais.

Às vistas da rejeição de US$ 1.2 bilhões do orçamento federal para o novo ano fiscal, o governo determinou, dia 7 de outubro, um novo quadro de medidas para aumentar a receita e assim cobrir os prejuízos causados pela decisão judicial. A Medida Provisória[2] que regulamenta o assunto, revogou nada menos do que oito leis tributárias diferentes[3]
, com algumas aberrações que, indubitavelmente serão questionadas nos tribunais. Ainda, o governo prometeu publicar dia 18 de outubro, os pormenores de um projeto de lei, que modifica a constituição para permitir a reintrodução daquelas medidas consideradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal.

1.2.- Não seria exagero afirmar que a pergunta que me é feita com mais freqüência por pessoas de negócios interessadas no Brasil é “Se os brasileiros são tão liberais e adeptos da inovação, porque, no seu país, as mudanças institucionais são tão intrincadas?”.

A resposta não é fácil. Tente imaginar um país de dimensões continentais, com vastas diferenças éticas e geográficas, com uma limitada experiência governamental em respeitar preceitos legais, enorme déficit educacional, e terá o quadro da realidade brasileira. Assim, mudanças institucionais, não são fáceis de serem realizadas, e a estagnação assegura a continuidade dos problemas.

1.3.- Eu fui convidado, e estou aqui, para expor uma visão panorâmica das intrincadas reformas de um Brasil que ainda se vale de modelos anacrônicos e conta com uma estrutura legal[4]
surrealista. Eu devo apontar as condições macroeconômicas brasileiras, as particularidades do trabalho com uniões de comércio, o perfil das relações comerciais atuais no âmbito do Mercosul e as negociações da Área de Livre Comércio das Américas. Minha apresentação dividir-se-á da seguinte forma:

i. Esta INTRODUÇÃO

ii. CONDIÇÕES MACROECONÔMICAS

iii. REFORMAS

iv. TRABALHANDO COM OS SINDICATOS

v. ACORDOS DE COMÉRCIO

vi. CONCLUSÕES2.1.-Se nos basearmos no poder de compra, o Brasil tem a 9ª maior economia do mundo, estimada em US$ 1,039 bilhões e a Argentina a 20ª maior, estimada em aproximadamente US$ 360 bilhões. Cinqüenta por cento (50%) do PIB brasileiro advém do setor de serviços, com 39.3% relacionados à indústria, e os restantes 10.7% da agricultura. Os componentes do PIB são 69,2% consumo privado, 10,8% consumo público, 20,3% investimentos; 13,6% exportações; e (13.9%) importações[5]
. Analisando-se cada uma das cinco regiões brasileiras, o sudeste é responsável por 59,4% do PIB brasileiro, o sul 17,1%, o nordeste 13,8%, o norte 4,4% e o centro-oeste 5,3%[6]
.

2.2.- Diferentemente do México, que direciona 80% do seu comércio externo para os EUA, Argentina e Brasil ostentam um perfil comercial mais diversificado. Ambos os países têm a União Européia como principal parceiro comercial. Em 1997, 27,4% das exportações brasileiras (53 bilhões) destinaram-se à União Européia, 24,7% para a Associação Latino América de Integração (LAIA); 17% para os EUA,; 5,7% para os países da OPEC, e 20,8% para outros. No mesmo ano, 26,7% das importações brasileiras (US$ 61,4 bilhões) vieram da UE, 23,3% dos EUA, 21,8% dos países da LAIA, 5,9% do Japão, 3,3% dos países da OPEC; e 19,1% de outros.[7]
O Brasil é o país menos dependente em termos comerciais, dentre as dez maiores economias do mundo, com apenas 7,3% do seu PIB relativo ao comércio internacional. Da mesma maneira, a Argentina tem apenas 8,6% do seu PIB relacionado ao comércio externo, à frente até mesmo dos EUA[8]
.

2.3.- O Brasil tem ainda a maior dívida externa de todos os países em desenvolvimento do mundo, de aproximadamente US$ 200 bilhões. Argentina tem a 7ª maior, estimada em US$ 125 bilhões. Consequentemente, Brasil e Argentina têm segunda e terceira maiores serviços de dívida de todos os países em desenvolvimento, depois do México, com US$ 36 bilhões e US$ 18 bilhões, respectivamente. Argentina tem o maior coeficiente de serviços de dívida – a porcentagem de serviços de dívida em relação ao país exportador de mercadorias e serviços – de 58,7% enquanto o Brasil está em segundo, muito próximo, com 57,4%. O Brasil tem o segundo maior déficit em conta corrente do mundo, depois dos EUA, em aproximadamente US$ 34 bilhões, e Argentina a 4ª maior, em quase US$ 10 bilhões[9]
.

2.4.- Assim, ambos, Argentina e Brasil são muito dependentes de empréstimos externos, e investimentos estrangeiros diretos. O programa de privatizações brasileiro trouxe um montante de investimentos externos sem precedentes, de US$ 1 bilhão em 1993; US$ 2,2 bilhões em 1994; US$ 5.1 bilhões em 1995; US$ 10 bilhões em 1996; US$ 17,5 bilhões em 1997; e US$ 20,3 bilhões em 1998[10]. As projeções para 1999 ainda indicam investimentos da ordem de US$ 20 bilhões. De 1991 a 1999, 88 empresas estatais e 29 estaduais foram privatizadas no Brasil, sendo que, a maioria delas dos setores petroquímico (27 companhias), de telecomunicações (25 companhias) e aço (8 companhias).

2.5.- O déficit público brasileiro, de janeiro a julho de 1999, era de R$ 80 bilhões, em 1998 era de R$ 73 bilhões; em 1997 de R$ 54 bilhões; R$ 47 bilhões em 1996, e R$ 49 bilhões em 1995. Como resultado, a dívida pública brasileira excede os R$ 500 bilhões, aproximadamente 50% do PIB brasileiro, mesmo depois de substancial receita obtida com o programa de privatizações, utilizada como empréstimo compensatório. Parte do déficit público é gerado pelo sistema previdenciário, estimado em R$ 46 bilhões em 1999. O setor público tem 9.918.000 pensionistas, levantando assim R$ 2,9 bilhões por ano enquanto gasta R$ 21,5 bilhões por ano, gerando déficit de R$ 18,6 bilhões. O setor privado tem 18,5 milhões de pensionistas levantando então R$ 51 bilhões por ano e empregando R$ 63 bilhões, gerando assim déficit de R$ 12 bilhões por ano[11]
. O valor médio da contribuição em fundos de pensão públicos é nove vezes maior do que os investimentos na área privada. Aproximadamente 80% dos gastos governamentais federais tem relação com salários e aposentadoria.

2.6.- Com o intuito de equilibrar as contas públicas, o governo valeu-se dos sempre crescentes impostos e reduções em investimento. Impostos federais cresceram 58,9% entre 1995 e 1998, enquanto o real crescimento do PIB foi de 10%. Em 1998, a sobrecarga conjunta de 70 taxas existentes no Brasil foi 30% do rendimento corporativo. Este ano, representará 35%. No próximo ano, excederá os 37,5%. Todas as oito diferentes leis tributárias revogadas pela medida provisória de 7 de outubro, foram decretadas depois de 1995. A estranha estrutura tributária brasileira permite a arrecadação sobre qualquer movimentação financeira ou sobre grandes lucros auferidos; há ainda dois impostos de valor agregado, comandados pela federação e estados; uma taxa sobre serviços, cobrada pelos municípios e outras aberrações singulares. Esta situação atípica e sua insana rigidez, não fomentam negócios, incentivando tão somente o setor informal da economia. Das 4 milhões de companhias registradas no Brasil, pelo menos 3.6 milhões estão em falta com a Receita Federal.[12]

2.7.- Com a reestruturação da democracia no Brasil, em 1986, uma nova Constituição foi decretada em 1988, dividindo o Judiciário em juizados comum e especial. Como o Brasil é uma federação, o juizado comum é responsável por ações civil e criminais, enquanto que os juizados especiais são responsáveis por questões trabalhistas, militares e eleitorais. Apelações devem ser direcionadas à segundas e terceiras instâncias. No topo da pirâmide está o juizado constitucional Supremo Tribunal Federal (STF), com 11 ministros. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), com 33 juizes, é a última instância para questões não constitucionais. Todos os tribunais de última instância estão sediados em Brasília, capital do Brasil.

2.8.- Desde a adoção da nova Constituição, em 1988, sentiu-se um movimento de ascensão dos litígios no país. Em 1998, os juizados especiais do trabalho, sozinhos resolveram 2,3 milhões de questões. É estimado que mais de 4 milhões de casos tenham sido decididos nos tribunais brasileiros em 1997. Em 1998, 52.000 casos foram decididos pelo STF, publicamente. No mesmo ano, o STJ decidiu 101.000 casos publicamente. Para cada Medida Provisória decretada pelo governo, há aproximadamente 30.000 litígios.

2.9.- Em desacordo com tais números, o judiciário brasileiro tem apenas, aproximadamente 10.000 juizes de primeira estância e 200.000 advogados atuantes, para uma população de 150 milhões de pessoas. Estes juizes são todos servidores civis que se submetem a um exame público de qualificação. Nas instâncias superiores, 20% dos membros vem de profissões legais bem como do ministério público, outra categoria de servidores civis. Juízos e tribunais mais sofisticados normalmente estão situados nos estados mais desenvolvidos. Atualmente, os casos demoram de 3 a 5 anos a serem decididos. O procedimento é extenso. Litígios são caros e a parte vencida paga integralmente as custas processuais e honorários advocatícios, que custam em média 20% do valor da causa. O poder judiciário não adota a doutrina da decisão vinculante (“stare decisis”) e então todos os casos são julgados individualmente, mesmo que tribunais superiores tenham decidido previamente a questão. Os estados e o governo federal são os litigantes mais freqüentes, normalmente situando-se no polo passivo, como resultado das contínuas contestações relativas à ordem legal, principalmente na área econômica. Governos municipais, estaduais e federal têm uma política fixa para o cálculo de indenizações determinadas sentencialmente.
3.1.- O primeiro período da administração de Fernando Henrique Cardoso, em 1995, foi marcada pelo sucesso das reformas em determinados setores da Constituição de 1988. Entre elas, a concessão de tratamento igual, perante a lei, à todas as companhias brasileiras, sem análise da origem do capital[13]
, e desmonopolização das telecomunicações[14]
, óleo e gás[15]
, e do setor de resseguros[16]
. Outras medidas foram adotadas para consumar a liberalização, que não ensejaram a criação de emendas constitucionais, tanto no setor bancário de transportes, quanto na privatização de setores não amparados pela Constituição[17]
. A reforma monetária foi efetuada em julho de 1994. O Plano Real, como ficou conhecido, veio a ser uma série de medidas temporárias, adotadas para manter a moeda estável, enquanto que reformas estruturais eram implementadas. O plano supervalorizou a moeda local em aproximadamente 35%, com vistas à manter as importações com preço baixo assim controlando a inflação. Isso também envolveu a imposição de taxas de juros altíssimas para atrair financiamentos estrangeiros e a liberalização das tarifas.

3.2.- A situação criada por decorrência de tais medidas não pôde sustentar-se devido à falência do governo e congresso que agiram privilegiando excessivamente reformas da infra-estrutura institucional. Como resultado, a moeda sofreu enorme pressão, tendo sido desvalorizada em Janeiro de 1999.

Retornando ao ano de 1996, o governo federal sabia que deveria equilibrar as contas públicas, reformar o Estado e melhorar a atmosfera propícia para negócios, e então instituiu uma agenda estratégica para que pudesse cumprir tais objetivos.[18]
Para atingir tais metas, a administração de FHC propôs as reformas social, previdenciária e tributária. Seria trágico para o Brasil e para o Mercosul que nenhuma delas fosse aprovada, e atualmente tais projetos tramitam no Congresso ou no judiciário. No entanto, outras duas reformas foram adicionadas à agenda, uma relativa ao Poder Judiciário e a outra sobre a estrutura política do país.

3.3.- A reforma da previdência social tende a equilibrar as pensões com as contribuições, bem como corrigir várias brechas no sistema, que incentivariam, de certa forma, aposentadorias antecipadas, acumulação de pensões e em casos excepcionais, altíssima renda para alguns poucos privilegiados. O governo também pretende alterar o critério do cálculo das pensões, para gradualmente fazer com que correspondam ao montante de arrecadações ao longo dos anos. Como mencionado no início da apresentação, o Congresso criou um projeto de lei para aumentar as contribuições dos mais altos empregados do setor público, e deduzir contribuições daqueles já inativos. Este projeto de lei foi considerado inconstitucional pelo STF.

Uma nova iniciativa legislativa para modificar a constituição, para permitir tais iniciativas é esperada para breve. No entanto, como será necessário quorum mínimo de dois terços, a chance de sucesso não pode ainda ser avaliada. Deve-se notar que algumas modificações muito importantes para o sistema previdenciário já foram aprovadas. Dentre elas destacam-se: o aumento da idade mínima para aposentadoria para 55 anos para as mulheres e 60 anos, para os homens, e novas regras para aposentadoria proporcional.

3.4.- A reforma administrativa vislumbra racionalizar o serviço público no Brasil, tornando-o mais eficiente, menos dispendioso e mais maleável. Tende a eliminar, em muitos casos, a estabilidade ou o sistema de direito adquirido, que vigoram até hoje e dão margem à gastos excessivos e acúmulo de benefícios. O governo também pretende apresentar legislação acerca de aumentos salariais para empregados em três ramificações governamentais. Parte da reforma, relativa ao acúmulo de benefícios (motivado pelo excesso de pessoal) já foi aprovado. Entretanto, partes opostas, que procuram manter o sistema de direito adquirido para o servidor civil, estão litigando no STF. Enquanto isso, o STF resiste às propostas para que seja necessária lei específica no caso de aumento de salários.

3.5.- A reforma fiscal é uma reivindicação constante do setor industrial brasileiro. Os altos custos derivados da tributação sobre negócios realizados no Brasil comprometeram a concorrência das empresas instaladas no Brasil numa escala global, e até mesmo internamente, numa economia aberta. O problema da estrutura tributária brasileira, com aproximadamente 70 impostos diferentes, levou setores importantes para a economia informal, que teve como conseqüência a corrupção dos agentes fiscais. Assim o fluxo natural do capital, e investimentos externos não foram incentivados. O sistema tributário com suas graves imperfeições desencadearam uma guerra fiscal entre os estados da federação com o escopo de atrair investimentos.

3.5.1.- Atualmente há um projeto de lei no Congresso que dispõe sobre a substituição de 9 taxas, inclusive a CPMF, para três: ICMS, taxa de valor agregado a ser dividida entre os estados e o governo federal, II, imposto de importação beneficiando o governo federal, e uma taxa de vendas atribuída aos municípios (IVV).

O governo apoia o projeto somente em parte, pois deseja manter a CPMF e a competência para criar novos impostos através de Medidas Provisórias e Decretos presidenciais. Estados e Municípios não pretendem compartilhar a receita tributária com o governo federal. A oposição quer criar novas taxas, inclusive uma taxação de 10% sobre grandes fortunas, acima de R$100 milhões.[19]
Deve ser frisado, contudo, que exportações de mercadorias não são taxadas pelos estados, para desgosto dos governos que sentem falta da receita perdida.

3.6.- Das tantas reformas necessárias ao país, a maior prioridade é sem dúvidas a reestruturação do judiciário. Sabe-se que o Poder Judiciário não é perfeito, mas apesar de todas as deficiências, detém a maior credibilidade. Dentre o 4 milhões de litígios solucionados em 1997, houve menos que 100 decisões consideradas arbitrárias. As reformas devem estabelecer: uma melhor infra-estrutura, ampliação da estrutura, mais treinamento, maiores facilidades e controle externo.

Considerando que o governo é o réu mais presente nos tribunais, e lembrando os anos de repressão enfrentados pela regra de lei brasileira nas ditaduras passadas, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é firmemente contra a adoção da doutrina da súmula vinculante (“stare decisis”), pois pode ser aplicada arbitrariamente. Direitos legítimos podem ser esquecidos se adotadas sentenças previamente divulgadas.

No projeto de lei relativo à reforma do judiciário, a extinção da Justiça Militar, e seu sistema processual, é contemplado; além da reestruturação da Justiça Trabalhista.
4.1.-Sindicatos surgiram no Brasil durante o governo fascista de Getúlio Vargas em 1930, e mantém muitos dos vícios deste tempo até os dias de hoje. O sindicalismo no Brasil era inicialmente rural, controlado pelo Estado, com benefícios garantidos pelo Estado e financiados pelo Estado. Modificações muito importantes foram introduzidas em 1978, durante a ditadura militar, e mais tarde com o triunfo da democracia, em 1986, além das trazidas pela Constituição, dois anos mais tarde.

4.2.-Relações de trabalho são reguladas pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) inúmeras leis complementares e vários regulamentos administrativos. As leis amparam os empregados durante até dois anos após o término do contrato de trabalho. O estatuto determina a prescrição das reclamações trabalhistas em prazo de cinco anos. Há um Tribunal Especial do Trabalho, responsável por aproximadamente 50% do orçamento do poder judiciário.

Relações trabalhistas no Brasil são muito litigiosas. Um empregado não é autorizado a renunciar a quaisquer direitos ou benefícios , garantidos por lei e determinados em contrato de trabalho. Trabalhadores devem possuir carteiras de trabalho nas quais é reconhecido o vínculo empregatício. Fusões e aquisições não afetam os direitos trabalhistas dos empregados. Créditos trabalhistas são privilegiados. Empregados e sindicato negociam aumentos salariais anualmente. Encargos sociais gerados pelos empregados representam mais de 80% do valor do salário[20]
. Diante dos custos extraordinários, muitos trabalhadores no Brasil atuam no mercado informal, onde as leis, exigências e direitos quase não são reconhecidos.

4.3.- Empregadores fazem contribuições de 8% da remuneração mensal do empregado para o Fundo de Garantia por tempo de Serviço, FGTS. Se um empregado é demitido sem justa causa, o empregado deve pagar um adicional de 40% sobre o valor dos depósitos prévios, mais respectivos vencimentos relativos ao tempo de serviço. Contratos podem ser extintos sem justa causa com aviso prévio de 30 dias. Empregadas grávidas não podem ser demitidas. Empregados não podem rescindir contrato de trabalho de um candidato à cargo no sindicato ou líder sindical até um ano depois do término do seu contrato de trabalho.

4.4.- Sindicatos no Brasil são conservadores e sustentam a estrutura paternalista inerente do passado. Têm fortalecido-se politicamente desde a reestruturação da democracia, mesmo se a porcentagem de membros for pequena se comparada aos padrões europeus. As principais uniões sindicatos são CUT, que representam 23 milhões de empregados e 2.000 entidades, está muito próxima do PT, Partido Trabalhista, o partido de oposição; CGT, representando 15 milhões de trabalhadores e 1.200 entidades; e FS, que representa 8.5 milhões de trabalhadores e 800 entidades. Os sindicatos são organizados nacionalmente e têm sede em todos os estados. O quadro de representação é muito pequeno, se proporcionalmente comparado à quantidade total de membros. A CUT, por exemplo tem apenas 25 membros no quadro executivo nacional.

4.5.- É muito difícil lidar com os sindicatos pois sua ideologia é sempre muito relacionada aos partidos políticos de oposição. Sindicatos não perceberam que a melhoria no clima dos negócios resultaria em maiores e melhores condições de emprego. No entanto, podemos notar uma tímida melhoria, já que a experiência obtida com o trabalho formal e o desemprego formal acabam por estabelecer a liderança. Potencialmente negócios e trabalho tendem a caminhar juntos e o crescimento da economia beneficia a ambos. O diálogo com os sindicatos tornou-se essencial para os negócios em expansão no país. De fato, os sindicatos são intimamente ligados aos partidos políticos, mas isso deve ser entendido como uma oportunidade, e não como obstáculo.
5.1.- O Tratado de Assunção, assinado em 16 de março de 1996 deu origem ao Mercosul entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, e tinha os seguintes objetivos:

i. livre circulação de capital, mercadorias, serviços e pessoas;
ii. a criação de uma tarifa externa comum e o estabelecimento de uma política externa comum; e
iii. a coordenação de políticas macroeconômicas.

5.2.- O Brasil participou das negociações do Mercosul com uma agenda de liderança regional política, ao invés de fixar-se em benefícios econômicos concretos, diferentemente dos argentinos, que negociaram diretamente com o setor de negócios. Para a Argentina o maior estímulo para a criação de um bloco econômico com o Brasil seria a possibilidade de acesso privilegiado ao enorme mercado interno, que poderia alavancar economias em uma escala inusitada para os padrões argentinos, tornando o país mais atraente para investimentos externos diretos. Para o Brasil, esta política fez com que o país abrisse seu mercado interno para o trigo argentino e suas indústrias automobilísticas, embora permitindo que a Argentina mantivesse barreiras ao açúcar brasileiro, sendo que este é o mais importante produto do país, ao longo dos 400 anos de sua história, cujo setor emprega 1.2 milhões de trabalhadores rurais. Essa situação impossibilitou a Argentina de atrair muitos investimentos para o setor automobilístico, uma vez que assegurou o acesso ao enorme mercado consumidor brasileiro, e um melhor ambiente institucional.

5.3.- Este cenário adversamente competitivo para o Brasil vis-à-vis Argentina foi exacerbado pela incompetência fiscal brasileira, que proporcionou o lançamento de um projeto econômico a curto prazo, o plano real implementado em 1994, que supervalorizou a moeda para incentivar as importações (que assim ficariam mais baratas) e assim, combater a inflação. Com o mesmo propósito, taxas de juros foram aumentadas a níveis sem precedentes, enquanto tarifas de importação foram diminuídas incrivelmente. Como resultado do Plano Real, a moeda brasileira ficou supervalorizada, 35%, em relação à Argentina, aumentando então a competitividade de produtos argentinos no mercado brasileiro. Em 5 anos de Plano Real, a Argentina acumulou saldo positivo com o Brasil de mais de US$ 6 bilhões[21].

5.4.- Desde o início do governo Menem, a Argentina adotou o sistema de paridade fixa (currency board) que institui a equivalência do peso argentino em relação ao dólar norte americano. Apesar de radical, esta medida foi muito bem aceita pela população argentina diante da instabilidade monetária instituída. Contudo, o Banco Central Argentino desistiu do controle da política monetária, devido ao regime de paridade, expondo o país aos riscos da flutuação cambial do dólar norte americano em relação às moedas de outros parceiros comerciais como o Brasil[22].

5.5.- Apesar do Brasil manter a estabilidade monetária, a combinação das vantagens obtidas com o Tratado de Assunção e a supervalorização da moeda brasileira resultou no sacrifício de setor de negócios, que atingiu o mais alto grau de competitividade no Brasil. O Brasil tornou-se o principal parceiro comercial da argentina, absorvendo quase um terço de suas exportações e metade da exportação das mercadorias manufaturadas. Além disso, o Brasil tornou-se o único país com o qual a Argentina obteve saldo positivo das operações comerciais, fato que indica as distorções presentes.

5.6.- Em meados de janeiro de 1999, o Brasil desvalorizou sua moeda, neutralizando as vantagens que favoreciam os parceiros do Mercosul. Consequentemente, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai caíram em uma profunda crise sócio-econômica, ameaçando não somente o Mercosul, mas também a estabilidade política da região. Esta crise gerou vários conflitos entre Brasil e Argentina em vários setores da atividade econômica. A Argentina tem de preservar o status quo e assim evitar o colapso de sua política monetária. Para compensar a recente competitividade dos produtos brasileiros no mercado interno, a Argentina utilizou-se de diversos meios, legais ou não, para restringir o acesso às importações brasileiras, em setores nos quais a importância é recíproca, tais como têxteis, papel, produtos eletrônicos, farinha e sapatos.

5.7.- Da mesma maneira, a Argentina cuidou de manter, nos primeiros seis meses de 1999 certo saldo positivo na balança de comércio com o Brasil, mesmo diante do comércio brasileiro quase em colapso, afetando muitos setores da economia de ambos os países. Ainda, o setor automobilístico requer uma nova regulamentação comum até o fim do ano, pelos compromissos multilaterais assumidos pelos dois países antes da Organização Mundial do Comércio (OMC). Algumas empresas do setor automobilístico que provavelmente sentiram as dificuldades na formulação de um regulamento para o setor no cenário atual, já mudaram suas linhas de montagem da Argentina para o Brasil.

5.8.- A ineficiência de Brasil e Argentina em lidar com seus problemas institucionais, levaram à falência quase que completa dos objetivos do Tratado de Assunção. A livre movimentação de capital não existe porque o Brasil continua controlando o câmbio. A livre circulação de mercadorias não é realidade no momento devido às muitas exceções da tarifa externa comum; em tratados assinados por Brasil e Argentina, não relacionados ao Mercosul; e ao recente e estranho tratamento comercial regional com tantas barreiras não tarifárias. Por exemplo, acordos voluntários de restrição de importação tornaram-se um meio muito utilizado para evitar conflitos bilaterais. A coordenação de políticas macroeconômicas caiu no ridículo depois da desvalorização da moeda promovida pelo governo brasileiro.

5.9.- Enquanto o MERCOSUL está atravessando uma profunda crise, as negociações da Área de Livre Comércio da América (ALCA) continuam em andamento, muito embora prejudicadas pela ausência de um regime de urgência (fast track), do Congresso dos Estados Unidos e pela atual administração norte americana.

A proximidade das eleições nos Estados Unidos e a próxima rodada da OMC são fatores que poderão afetar as negociações do ALCA. Estas também serão profundamente abaladas pela atual turbulenta situação econômica da América do Sul. No entanto no próximo encontro ministerial do ALCA no dia 3 de novembro em Toronto no Canadá devem ser aprovadas medidas que irão facilitar negócios alfandegários. Tais medidas incluiriam um código de conduta para fiscais aduaneiros, regras procedimentais para carregamentos expressos ou não, e procedimentos para admissão temporária de executivos em viagens de negócio[23].
6.1.- Tanto a Argentina quanto o Brasil, estabeleceram como prioridades as reformas tributária, previdenciária das relações de trabalho, administração pública e do judiciário. Ambos os países tentaram alcançar o equilíbrio fiscal enquanto conduziam as negociações econômicas privadas. Infelizmente, Brasil e Argentina falharam igualmente em sua atuação perante o Mercosul.

6.2.- Mesmo se alcançado, o equilíbrio fiscal, obtido sem radical melhoria da economia como um todo, poderia causar a falência do modelo de economias abertas, aplicado ao Brasil e à Argentina. Isso resultaria no naufrágio do Mercosul. A alternativa de uma economia fechada, para felicidade dos populistas, ocasionaria estagnação, miséria, agitação e provavelmente, violações das regras legais.

6.3.- Governos regionais e nacionais têm de aprender a gastar menos e de modo mais eficaz. Uma reforma tributária radical deveria ser implementada para estabelecer um sistema compatível com o sistema adotado pelos outros parceiros comerciais, para que a competitividade industrial e dos negócios fosse garantida. Leis trabalhistas deveriam se modernizadas tanto na Argentina quanto no Brasil e o objetivo da integração legislativa no âmbito do Mercosul oferece tal oportunidade. O Brasil não pode querer ser um competidor no comércio global e almejar receber mais investimentos estrangeiros, com a manutenção do controle de câmbio. A Argentina não pode esperar que o Mercosul sobreviva mantendo o regime de paridade com o dólar norte americano. Uma moeda comum poderia ser a alternativa se as condições adequadas favorecerem tal implementação. O Mercosul também deveria ter um Tribunal Regional do Comércio ou uma Corte de Justiça.

6.4.- De qualquer forma, o Mercosul não pode sustentar-se se as condições econômicas propícias não forem realidade no Brasil e na Argentina.