São Paulo – As exportações brasileiras para a República Popular da China no primeiro trimestre de 2009 alcançaram US$ 3,4 bilhões, de acordo com as estatísticas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, com um crescimento de 62,67% em valor sobre o mesmo período do ano anterior e ultrapassaram as vendas de nosso país para os Estados Unidos da América, que foram durante décadas o principal comprador do Brasil. De acordo com as estatísticas do governo chinês, que adota metodologia diversa, os números são ainda maiores.
É ainda significativo que a Ásia tenha igualmente superado a América Latina como parceiro comercial do Brasil. Os números demonstram que as medidas internas de combate à crise na China causaram um impacto positivo nas exportações brasileiras muito maior do que as próprias ações tardias, desencontradas, trôpegas e pífias tomadas pelo governo do Brasil.
De fato, apenas em abril de 2009, mais de seis meses do desencadear da fase aguda da crise, o Banco Central do Brasil reduziu a taxa Selic de juros para 10,25%, o que coloca a taxa real brasileira próxima dos 5% ao ano, ainda uma das maiores do mundo. Ao contrário, na China as taxas de juros são hoje negativas em 0,5%. Como conseqüência, o Real continua supervalorizado, o que prejudica nossas exportações.
Outras medidas de apoio econômico na China, tomadas já em outubro de 2008, quando o governo do Brasil ainda falhava de maneira dramática no diagnóstico do impacto da crise em nosso país, fizeram com que a economia interna do país oriental continuasse aquecida. Assim, o governo chinês pôde declarar, em abril de 2009, que o crescimento do trimestre, de 6,1 representava o patamar mais baixo do desempenho econômico durante a crise e que suas projeções para o ano indicavam um número maior.
O crescimento da pauta comercial sino-brasileira pegou de surpresa o governo do Brasil e também amplos setores empresariais de nosso país, que têm um desconhecimento enciclopédico sobre a China, alimentado, como é natural nestes casos, pelo preconceito. Da parte do governo brasileiro, as ações para impulsionar as trocas comerciais quantitativa e qualitativamente com a China são nulas.
Como é sabido, o Ministério das Relações Exteriores tem mantido desde 1974 apenas uma meia dúzia de diplomatas no país oriental, sem conhecimento da língua chinesa e sem especialistas à altura dos desafios na área comercial, nas mesmas precárias instalações da época da Revolução Cultural. O posto na China não atrai os diplomatas brasileiros por deixar de ser chic, o que contraria o ethos do Itamaraty.
Por sua vez, os empresários brasileiros são, de uma maneira geral, mais temerosos da competição chinesa do que entusiastas na busca de oportunidades existentes no país asiático.
Assim, preocupam-se mais os brasileiros com medidas artificiais de proteção comercial do que medidas pró-ativas junto ao governo brasileiro para que as condições de custo brasileiro sejam mais compatíveis com a competição internacional, bem como ações de mercado na China para desenvolver a colocação de nossos produtos.
Assim, o número de empresas brasileiras na China, menor que cem, é inferior àquele das companhias chilenas, próximo a 200, sendo que o Chile tem uma economia com tamanho equivalente àquela da cidade de São Paulo. Apesar de ter a China se tornado o maior comprador de produtos brasileiros, não há nenhuma agência comercial de bancos brasileiros naquele país, mas apenas duas representações, que não podem realizar negócios.
Acresce que nenhuma companhia aérea brasileira voa para o país oriental e as gestões de promoção de nossa cultura e produtos na China são praticamente nulas. Para que o empresário chinês possa conseguir obter um visto de entrada no Brasil deverá passar por uma experiência humilhante e um processo vagaroso e burocrático. Pelo desconhecimento que o empresário chinês tem do Brasil, há uma resistência a fazer investimentos no País, que propiciariam um aumento de nossas vendas com valor agregado e maior atividade econômica interna.
Infelizmente, a próxima visita do presidente Lula à China não deverá trazer benefícios de monta às relações bilaterais, já que foi mal-preparada na formatação da agenda, desfocada dos pontos principais estratégicos nas relações comerciais bilaterais, e desorganizada por parte dos organizadores brasileiros da missão empresarial de nosso país e no programa a ser por ela cumprido.
É importante que governo e empresários brasileiros deem maior atenção à China, e bem assim à Ásia, porque é neste continente que ocorre hoje a retomada da crise mundial. É também a partir da Ásia que será formatada a nova economia para as próximas décadas.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).