Londres – Reuniu-se no último dia 15 de novembro a cúpula das principais economias mundiais, em Washington D.C., capital dos Estados Unidos da América, em encontro do chamado G-20, organização informal que reúne Alemanha, África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coréia do Sul, EUA, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia, Turquia e União Européia (UE).
Na agenda, estava a coordenação dos esforços para o enfrentamento da grave crise financeira que, há meses, abate-se sobre o mundo. A reunião representou um divisor de águas no sentido de que, pela primeira vez na história, reconheceu-se a importância da cooperação dos países em desenvolvimento na formatação de uma política global, ao invés de imposições pelos países desenvolvidos aos demais.
É claro que tal posição vem como decorrência do papel crescente que as grandes economias em desenvolvimento, como o Brasil, a China, a Rússia e a Índia, têm desempenhado no crescimento global. Leva ainda em conta o volume de reservas em moedas estrangeiras acumuladas por esses países, notadamente pela China, no valor hoje de cerca de 2 trilhões de dólares americanos.
Certo é, ainda, que os países desenvolvidos gostariam de poder utilizar tais reservas para permitir a salvação de suas economias domésticas. Como sempre, os países ricos (ou deveria dizer, ex-ricos) tomaram para si a liderança do encontro, não apenas pela sua convocação (de iniciativa da UE) e pelo local do encontro (EUA), como também por sua agenda, acertada entre os grandes com a habitual antecedência.
Uma reunião preparatória dos ministros da fazenda do G-20, realizada na cidade de São Paulo, no dia 7 de novembro, serviu apenas para confirmar a apósita agenda temática sugerida pelos países desenvolvidos, já que os emergentes ainda não fazem a sua coordenação prévia, o que é de se lamentar.
Na cimeira de Washington, os países fizeram-se representar por seus chefes de governo e ministros da fazenda. Nesse particular, a formatação foi favorável ao Brasil, por permitir que nossos interesses fossem representados pela Fazenda, que é do ramo, e não pelos indefectíveis diletantes nefelibatas de sempre.
As resoluções, todas de caráter retórico, tomadas pela cúpula serviram para, em primeiro lugar, justificar as ações descaradas já tomadas de subsídios e intervencionismo estatal para a cobertura de prejuízos privados sem consultas e isoladamente pelos países desenvolvidos, que são contrárias à ordem jurídica multilateral da OMC (Organização Mundial do Comércio), da mesma maneira que aquelas ainda putativas, como para o setor automobilístico.
Em segundo lugar, houve a exortação para a cooperação internacional no combate aos efeitos da crise, onde se deve também entender uma pressão para que os chineses e japoneses desembolsem suas reservas para o benefício das países ricos.
Mais ainda, acordou-se, conforme desejavam o Brasil e outros países em desenvolvimento, na necessidade da reforma das instituições de Bretton Woods, ou sejam, o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Banco Mundial, que pecam por muitos vícios e tem um viés da promoção dos interesses dos países desenvolvidos.
Infelizmente, não se acordou na reforma do regime jurídico da OMC, altamente lesivo aos interesses dos países em desenvolvimento, e hoje anacrônico pelo colapso de sua ideologia inspiradora, o neoliberalismo, com as medidas de intervenção estatal e subsídios diversos praticados pelos EUA e pela UE.
Ao contrário, instou-se pela retomada das negociações da Rodada Doha da OMC, formatada numa agenda totalmente adversa aos países em desenvolvimento, e que dará novamente o papel de negociador principal do Brasil ao Celso Amorim, homem que historicamente dá ao país resultados sofríveis ou penosos, mas sempre maquiados pela boa propaganda do Itamaraty.
Outras deliberações da cúpula do G-20 foram positivas, como a reforma dos mercados de derivativos, a revisão de práticas de remuneração nas instituições financeiras, a revisão dos critérios de governança no setor financeiro, a revisão das normas contábeis geralmente aceitas e uma necessária regulamentação das atividades das agências avaliadoras de risco, atualmente caracterizadas por cego etnocentrismo.
Mais ainda, acordou-se na continuidade de cooperação para a perseguição da agenda, através de outros encontros, para os quais os países em desenvolvimento deverão, espera-se, coordenar-se melhor para a promoção de seus interesses comuns, que são muitos.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).