Poucos países levam tão a sério o Mercado Comum do Sul (Mercosul) como os Estados Unidos da América (EUA). De fato, se não o levassem não teriam sistematicamente tentado desestabilizar o bloco desde os seus primórdios, em 1991. No início, os EUA exploraram as fraquezas institucionais, morais e éticas do governo argentino de Carlos Menem, para inspirar uma política de paridade fixa do peso com o dólar americano, que era tanto insana quanto desastrosa, já que o país sul-americano não tinha fontes suficientes de receita daquela moeda.

O seu principal parceiro comercial era o Brasil e o seu principal investidor a União Européia (UE). No entanto, os EUA instaram o Fundo Monetário Internacional (FMI), um organismo internacional sob seu controle, a propor a política de paridade fixa à Argentina, garantindo a sua viabilidade através de onerosos empréstimos externos, que causaram um endividamento cada vez maior deste país.

O objetivo da política dos EUA não era o financeiro, a buscar uma maior prosperidade do país sul-americano, mas sim geopolítico, com o propósito de diferenciar a política monetária argentina daquela brasileira, procurando assim inter alia frustrar a coordenação macroeconômica, um dos objetivos do Tratado de Assunção. Da mesma maneira, os EUA mostravam aparentemente favorecer a Argentina nos foros internacionais, para dela extrair concessões altamente custosas, como a assinatura dos infames Acordos Bilaterais de Investimento, que levaram o país à ruína, com o colapso da grotesca política econômica.

O resultado é hoje história. O país sul-americano, a duros custos, procura recuperar-se da desastrosa aliança, soi disant carnal, promovida por interesses imperialistas e aceita por seu governo irresponsável de então. Tendo sido seus propósitos expostos de maneira tão dramática no caso argentino, os EUA procuraram então buscar na frágil e triste figura do então presidente uruguaio, Jorge Battle, um aliado para seus planos de desestabilização regional.

Nesse propósito, o Uruguai passou a se dissociar das posições comuns do Mercosul, dificultando ou impedindo um consenso em muitas questões regionais importantes, como por exemplo na agenda da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) e nas negociações para a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Por vezes, os negociadores uruguaios passaram até mesmo a propor e advogar as posições dos EUA, como verdadeiros prepostos.

Esse triste quadro não durou muito. Mais uma vez, os EUA tiveram sua agenda frustrada pela visão do povo uruguaio, que repeliu energicamente as posições trôpegas e pusilânimes de Battle nas urnas, tendo elegido um candidato da oposição e contrário não somente à política servil do Uruguai com relação aos EUA, como quanto à de instrumento deste na desestabilização do Mercosul. Permanecem hoje sem aprovação do congresso uruguaio os Acordos Bilaterais de Investimento assinados pela administração anterior.

Tendo sido novamente frustrado nos seus vis e deletérios propósitos, o incansável governo imperialista dos EUA buscou no governo do Paraguai o seu novo instrumento de desestabilização regional. Para tanto, não hesitou em lançar mão de uma iniciativa de caráter militar, que tem um preocupante potencial de problemas para a região. A diplomacia brasileira já declarou que a presença de tropas estrangeiras no território de um Estado membro do Mercosul contraria o espírito do Tratado de Assunção.

De fato, em 5 de maio deste ano, mediante troca de notas, os governos do Paraguai e dos EUA autorizaram exercícios e intercâmbios militares no território paraguaio, com presença militar de 400 soldados norte-americanos, no período (prorrogável) de 18 meses compreendido entre o 1º de julho de 2005 e 31 de dezembro de 2006. Para tanto, o congresso paraguaio aprovou a condição de funcionários diplomáticos das tropas norte-americanas (sic), concedendo-lhes imunidade absoluta!

Mais ainda, oficializou-se a presença americana na base de Mariscal Estigarribia, situada em região estratégica, a poucos quilômetros das fronteiras da Argentina, Bolívia e Brasil. A base conta com uma pista de aterrissagem de 3.800 metros e situa-se a menos de 100 quilômetros de distancia das reservas de gás e petróleo da Bolívia, próxima da represa de Itaipu e rigorosamente sobre o Aqüífero Guarani.

Os governos de Argentina, Brasil e Uruguai, bem como o povo do Paraguai, não devem subestimar essa grave ameaça à estabilidade política e econômica regional.