Buenos Aires – O governo argentino anunciou o interesse em conduzir negociações no âmbito do Clube de Paris, para tratar do reescalonamento de sua dívida oficial junto aos países credores, no montante de US$ 6,3 bilhões, que se encontra vencida e em mora desde 2001. O anúncio implicitamente reconhece que a falta de acordo com os organismos oficiais tem prejudicado o clima de novos investimentos no país.
O Clube de Paris é um organismo oficial de natureza informal que se reúne na capital francesa de 10 a 11 vezes ao ano, cuja missão é ajudar financeiramente países em crise de liquidez e assim receber os empréstimos devidos. Ele é composto de Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Espanha, EUA, Finlândia, França, Holanda, Irlanda, Itália, Japão, Noruega, Reino Unido, Rússia, Suécia e Suíça.
Os empréstimos elegíveis para renegociação no âmbito do Clube de Paris são aqueles oficiais concedidos pelos governos dos países membros ou ainda os créditos comerciais à exportação garantidos pelos tesouros nacionais dos países que compõe o organismo.
O Clube de Paris foi formado originalmente em 1956, coincidentemente para renegociar a dívida oficial da Argentina. A partir de 1956, o Clube de Paris fechou 400 reestruturações com 84 países. Desde aquele ano, o país sul-americano retornou ao organismo em 1962, 1965, 1985, 1987, 1989, 1991 e 1992. Os principais credores atuais da Argentina são a Alemanha, a Espanha, os EUA, o Japão, a Holanda e a Suíça.
O anúncio do governo argentino segue-se à liquidação de 76% da dívida do país em títulos detidos por pessoas físicas e jurídicas de direito privado, em condições que foram criticadas em muitos setores, tendo em vista os descontos obtidos pelo país sul-americano. Segue-se, também, à liquidação da dívida argentina perante o FMI (Fundo Monetário Internacional) ocorrida em 2006.
Uma condição tradicional do Clube de Paris é a existência de um acordo prévio entre o governo devedor e o FMI. Trata-se de exigência que pode dificultar as negociações com o governo Kirchner, porque existe na Argentina a tanto generalizada quanto correta percepção de que a responsabilidade pela crise financeira do país recai exatamente no FMI.
De fato, é amplamente sabido que o organismo multilateral instou o país sul-americano a uma política insana e insustentável de paridade monetária com o dólar estadunidense, a qual chegou a financiar, induzida por setores do governo dos EUA, que pretendiam afastar a Argentina do MERCOSUL. Pois bem, tal política econômica implodiu tragicamente em 2001, com graves conseqüências sociais para a nação argentina, e das quais ainda não se recuperou totalmente.
Dessa maneira, não é razoável esperar que a Argentina retorne ao FMI, tanto pela absoluta e irreparável perda de credibilidade do organismo multilateral, de resto obsoleto, como pela falta de condições políticas do governo argentino para tanto.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).