Um novo projeto de lei em discussão pelo governo chinês pode ser mais um passo para a abertura do gigante mercado asiático para investidores internacionais. A China estuda permitir a abertura de empresas por estrangeiros como pessoas físicas. A medida deve estimular o surgimento de pequenas e médias companhias, contribuindo, principalmente, para a abertura do mercado chinês de serviços.
"A nova lei pode favorecer o Brasil, que não possui tantas empresas de grande porte", diz Bento Delgado Kardos, do Noronha Advogados, especialista em China. Ele explica que a medida reduzirá o risco dos investidores brasileiros. "Ao investir como pessoa física, caso a empreitada internacional não dê certo, é possível proteger os ativos da empresa no Brasil."
Divulgada no início de 2007, a sociedade de investimento estrangeiro (termo que designa a nova modalidade de investimento) é composta por 38 artigos, distribuídos em quatro capítulos. Durante o Congresso do Partido Comunista chinês, em outubro, o governo se comprometeu a solucionar o tema em 2008. O projeto de lei está disponível para avaliação das agências governamentais. "Ainda há pontos obscuros, mas pode ser um passo na direção certa", diz Gustavo de Jacobina Rabello, diretor do escritório da Noronha Advogados em Xangai.
O advogado explica que a nova estrutura é similar a uma limitada no Brasil. A modalidade admite como sócios pessoas físicas ou jurídicas, estrangeiras ou chinesas. Segundo Rabello, o governo chinês ainda não informou qual será o capital mínimo da sociedade de investimento estrangeiro, mas analistas estimam que custará mais barato que uma joint venture ou uma empresa de propriedade inteiramente estrangeira na China.
Quando a China comunista decidiu abrir suas portas, o investidor interessado em entrar no mercado podia optar apenas por duas trilhas, ambas bastante estreitas. A primeira é a formação de uma joint venture com uma empresa local, caso da Embraer e Embraco. Outra opção é abrir um escritório de representação, que não pode gerar lucros. Uma das desvantagens é ser taxado pelas despesas e não pelos lucros. Muitas companhias buscaram esse caminho para experimentar o mercado.
Após a entrada na OMC em 2001, a China se comprometeu com maior abertura e regulamentou uma lei que permite o estabelecimento de empresas de propriedade inteiramente estrangeira. Teoricamente, essas companhias poderiam surgir em qualquer setor. Mas, como é necessária autorização prévia do governo, setores estratégicos, como militar ou telecomunicações seguem fechados. O capital social mínimo necessário para a abertura da empresa pode variar bastante conforme a região e a negociação com o governo.
Jun Zhang, advogado chinês que trabalha na Noronha Advogados em São Paulo, explica que o governo do país está equalizando os impostos pagos por estrangeiros e chineses. Recentemente, a China reduziu os impostos cobrados das empresas nacionais de 33% para 25%. Já os investidores estrangeiros, que podiam solicitar incentivos que reduziam a taxação para algo entre zero e 15%, perderam parcialmente esse benefício. O governo pretende elevar os impostos de empresas estrangeiras nos próximos cinco anos até chegar a 25%.
"Está mais difícil para os estrangeiros conseguirem benefícios fiscais", diz Zhang. Dessa maneira, o governo chinês – preocupado com a inflação e com o super aquecimento da economia – tenta desencorajar grandes investimentos. Os Estados e municípios também estão mais rigorosos na hora de aceitar investidores estrangeiros, recusando, por exemplo, companhias poluidoras.
A sociedade de investimento estrangeiro pode ser uma vantagem do ponto de vista fiscal, dizem os advogados. Atualmente, as empresas estrangeiras instaladas na China sofrem com a dupla taxação, pagando impostos sobre os rendimentos e dividendos entregues aos acionistas. Pelo projeto, o imposto de renda incidiria apenas sobre a distribuição de dividendos.
Outro ponto interessante é que uma estatal não poderá ser sócia de uma sociedade de investimento estrangeiro. "É garantia de que o negócio será restrito ao setor privado e pode ajudar aqueles investidores que temem a influência do governo chinês", diz Rabello.
Algumas normas, no entanto, geram receio. O investidor estrangeiro deve ser obrigado a contribuir com 100% do capital em até 90 dias após a aprovação da sociedade. Essa regra é incompatível com o modo de operação típico dos fundos de private equity.