Cascais – O ministro de Estado das Relações Exteriores, embaixador Celso Amorim, descobriu aquilo que qualquer mascate brasileiro já sabe: a China e os países asiáticos são uma realidade importante na economia e no comércio exterior brasileiro. Com tal difícil, laboriosa e intrincada constatação, o ministro declarou que o ano de 2008 será, para o Itamaraty, “o Ano da Ásia”.
Embora tardia, é oportuna a maior atenção pelo governo brasileiro aos países asiáticos e, em especial, à China que, segundo as últimas estatísticas para este ano, passou a responder por nada menos de 10.1% das importações brasileiras, atrás apenas dos EUA. Este surto apreciável das importações provenientes da China corresponde a um crescimento de 54%, em comparação ao mesmo período do ano passado.
Por sua vez, é fato que as exportações brasileiras para o país asiático também crescem, mas a um ritmo muito menor, já que a China é compradora de mercadorias brasileiras com cotação internacional e baixo ou nenhum valor agregado.
O perfil das importações brasileiras da China assemelha-se ao daquelas dos EUA do mesmo país, com ênfase em material elétrico, eletrônico e equipamentos. A situação do comércio dos EUA com a China é muito preocupante, já que apenas em 2006 o país acumulou um déficit de US$ 232 bilhões com a nação asiática.
Para lidar com o comércio deficitário, os EUA valem-se de todos os tipos de pressão, inclusive a política e a militar. Protestam veementemente com relação ao câmbio desvalorizado do Yuan, que torna as exportações chinesas mais baratas. Acusam a China por pretensas violações dos direitos humanos. Reclamam dos padrões de segurança dos produtos chineses e denunciam a legislação trabalhista como desumana.
De mais a mais, no âmbito comercial, em 2006 os EUA levaram ao sistema de resolução de disputas da OMC uma primeira queixa contra a China, no tocante às tarifas sobre autopeças importadas. Mais recentemente, já em 2007, os EUA iniciaram uma nova disputa contra a China na OMC referentemente aos subsídios à exportação e as regras de conteúdo local.
Acresce que os EUA parecem estar a preparar um novo caso contra o país asiático com relação à aplicação das normas sobre a proteção à propriedade intelectual.
Pois bem, para lidar com uma vasta agenda de interesses comerciais bilaterais, China e EUA institucionalizaram canais de diálogo através de uma JCCT (Comissão Conjunta sobre Comércio e Trocas) e de um organismo denominado Diálogo Estratégico Econômico. Os chineses, é claro, preferem recorrer ao diálogo através de tais mecanismos a sofrer as notórias ações unilaterais dos EUA.
Com a descoberta da China pelo Itamaraty, talvez fosse interessante para o governo brasileiro aproveitar-se da experiência dos mecanismos mantidos com os EUA para promover o diálogo constante com o país asiático, de maneira que o comércio bilateral possa continuar crescente e a promover a prosperidade recíproca. Também seria interessante que o MRE (Ministério das Relações Exteriores) capacitasse melhor seus quadros para as relações com a Ásia, já que no momento não temos sequer um diplomata que fale o mandarim.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).