PORTO ALEGRE – Com atraso de cerca de três meses, foi apresentado, há dias atrás, o relatório da comissão dos 16 notáveis nomeados pelo secretário geral da Organização das Nações Unidas (ONU), sr. Kofi Annan, a respeito, inter alia, da reforma do Conselho de Segurança. A questão reveste-se de grande urgência dado o anacronismo da atual composição, assentada num total de 15 membros, dos quais cinco permanentes e dez não permanentes, conforme já tive a oportunidade de abordar em meu artigo “A reforma do Conselho de Segurança da ONU”

Os trabalhos dos membros da comissão, da qual fez parte o experiente, hábil e preparado diplomata brasileiro, embaixador João Clemente Baena Soares, foram difíceis, como se pode imaginar, ante à diversidade dos interesses nacionais em jogo. Como freqüentemente ocorre em situações em que o consenso é necessário, o resultado deixou muito a desejar, muito embora tenha sido claramente o possível, dada a composição da comissão.

De fato, o projeto de reforma do Conselho de Segurança da ONU traz duas opções. Em ambas, o número de países componentes do conselho passaria dos atuais 15 para 24. Contudo, na chamada opção A, dos nove novos membros, seis teriam o caráter permanente, mas sem direito a veto, sendo que os três restantes estarão sujeitos ao mesmo perfil dos atuais dez não permanentes, com rotação bienal. Por outro lado, na opção B, oito dos novos membros terão o caráter definido em eufemismo diplomático como “semi-permanente”, ou seja com mandato de quatro anos, ao passo que o membro novo restante terá o mesmo perfil dos atuais dez não permanentes.

A solução afigura-se injusta porque, em primeiro lugar, mantém o poder de veto nas mão de cinco Estados, a saber: China, Estados Unidos da América (EUA), França, Inglaterra e Rússia. No mundo de hoje, nada justifica o voto qualificado com tais poderes na mão de um punhado idiossincrático de Estados. Se mantido o poder de veto, como justificar a sua não atribuição a países como África do Sul, Alemanha, Brasil, Japão e Índia? Assim, afigura-se claro que o ideal seria a deliberação por maioria, simples ou qualificada, dependendo da matéria, com a eliminação pura e simples do veto. Em tal não sendo pragmático ou possível, que o direito de veto fosse ampliado a um número mais representativo de países.

Dessa maneira, tanto a chamada opção A como a opção B padecem do vício grave da manutenção do poder de veto concedido a uns poucos países, dentre os quais os EUA, os principais desestabilizadores da ordem jurídica multilateral, como já tive a oportunidade de examinar exaustivamente nesta coluna. Nenhuma das duas alternativas reforçará de modo substancial o Estado de Direito nas relações internacionais já que, em realidade, ao invés de refletirem um sistema com duas categorias de Estado, apenas interpõem uma outra intermediária. É certo que a categoria intermediária da opção A é mais atraente para os seis países que forem eventualmente beneficiados, devido ao caráter permanente. Por sua vez, a categoria intermediária da opção B representaria apenas um mandato dobrado para os oito países escolhidos.

Potências regionais, como o Brasil, África do Sul, Índia, Alemanha e Japão favorecem a opção A. Sub-potências regionais, como o Paquistão, México, Argentina e Itália, favorecem a opção B. Resta saber apenas para que lado penderão os Estados sem pretensões regionais ou globais, que são a grande maioria. Para o observador interessado na primazia da eqüidade, da justiça e do direito nas relações internacionais, no entanto, resulta uma frustração nítida. Em março de 2005, o secretário-geral da ONU mandará sua recomendação a respeito da reforma do Conselho de Segurança, para a deliberação da Assembléia Geral.