A paranóia institucionalizada existente nos EUA (Estados Unidos da América) com o que é estrangeiro decorre do sentimento sedimentado de profundo desprezo por tudo o que é forasteiro e é agravada pelo arraigado racismo que ainda orienta as políticas públicas no país. Quando cumulada com apetites econômicos tanto rapazes quanto insaciáveis, a fobia cria aberrações que distanciam os EUA não apenas da comunidade das nações, mas também dos valores humanitários internacionalmente reconhecidos.
No dia 19 de julho de 2010, o Presidente dos EUA, Barack Obama, anunciou o deslocamento de 1.200 membros da Guarda Nacional federal para as tarefas de patrulhamento das 1.300 milhas (cerca de 2.100 quilômetros) de fronteira com o México, com efeito imediato, a partir de 1 de agosto do mesmo ano.
A notícia causa estranheza, em primeiro lugar, porque o México é um importante aliado dos EUA, que ocupam dois terços do território original do país latino-americano, como resultado de uma guerra de conquista. Como consequência, parte substancial da população do sudoeste dos EUA é de origem mexicana.
Mais ainda, o México, juntamente com o Canadá e EUA, é membro do Acordo de Livre Comércio da América do Norte, o NAFTA, de 1991, uma iniciativa ostensivamente criada para promover o crescimento das trocas na região, inclusive no setor de serviços. As trocas comerciais bilaterais, entre o México e os EUA, são muito importantes, o que também ocorre com os investimentos.
Ocorre que, movidos por profundo sentimento de racismo e incomodados com o crescimento da chamada cultura hispânica e de seus elementos étnicos no sudoeste do país, desenvolveu-se uma grande mobilização na região fronteiriça com o México. Barreiras foram erguidas; acessos limitados e controles criados, tudo próprio de um país em guerra.
Não bastassem todos os meios tecnológicos empregados para controle fronteiriço, os EUA têm 17.339 agentes de patrulhamento de fronteira na divisa com o México, o que representa um operador para cada 125 metros! É esse o contingente que agora será reforçado pelas tropas da Guarda Nacional.
O disparate no tratamento da questão fronteiriça com o México não é, contudo, a única aberração decorrente da paranóia institucionalizada existente nos EUA. O jornal americano, The Washington Post, denunciou em sua edição de 19 de julho de 2010 que os EUA têm 1.271 organizações governamentais e 1.931 companhias privadas trabalhando com contra terrorismo, segurança nacional e inteligência. Cerca de 854 mil pessoas, uma vez e meia a população da capital do país, Washington D.C., têm a classificação máxima de segurança.
A paranóia americana com o imaginado risco que advém do exterior é, na realidade, alimentada pelo complexo industrial e militar do país, denunciado já pelo presidente Dwight Eisenhower, um ex-general que conhecia muito bem o setor. Hoje, esse complexo domina a economia e a política dos EUA.
Sem inimigos, sem riscos externos e ameaças forâneas, os EUA poderiam prescindir de todo o aparato público e privado utilizado na pretensa proteção nacional. Cumpre-se então criá-los!
A persistir essa orientação, o que é muito provável, os EUA se distanciarão mais e mais dos melhores valores humanos, da comunidade das nações e da solidariedade internacional. Suas ações continuarão a ser percebidas como monstruosidades e repudiadas pela consciência social global.
Finalmente, a economia dos EUA, já em frangalhos e acentuada ruína, continuará a se deteriorar, não apenas pelo isolamento internacional, mas pelos próprios erros de gestão interna ligados a tais políticas.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).