São Paulo – Faleceu no dia 17 de janeiro de 2010, na Índia, aos 95 anos de idade, Jyoti Basu, líder histórico do Partido Comunista Indiano, e primeiro-ministro (cargo equivalente dentre nós àquele de governador) do importante estado indiano de Bengala Ocidental, com capital em Calcutá, pelo longo e ininterrupto período de 23 anos.
Nascido em 1914, em Calcutá, numa família burguesa (seu pai era médico), Jyoti Basu estudou direito no Reino Unido, onde pessoas com o seu perfil frequentemente eram atraídas pelo Partido Comunista Britânico, na busca desesperada por opções humanísticas, face às iniqüidades sociais existentes no seio do Império Britânico e a cruel exploração sistemática de suas colônias.
Jyoti Basu firmou-se como um campeão dos interesses do povo indiano tendo dedicado sua vida à construção de uma sociedade sem castas, classes ou exploração. Inicialmente, após a proclamação da independência da Índia em 1947, ocupou-se da organização sindical dos trabalhadores nas estradas de ferro. Em alguns períodos, entre 1948 e 1951, enquanto seu partido foi banido, teve que se recolher à clandestinidade
Em 1977, a coligação da frente de esquerda, dominada pelo Partido Comunista Indiano, obteve a maioria nas eleições regionais, tendo sido convidada a formar o governo do Estado de Bengala Ocidental, do qual Jyoti Basu tornou-se primeiro-ministro. Sua primeira tarefa foi a de restaurar a estabilidade num meio comprometido pelo radicalismo da extrema esquerda.
No governo de Bengala Ocidental, que dirigiu com um mandato de 23 anos, até o ano 2000, esteve à frente de um ambicioso programa de redistribuição de terras de enorme sucesso. Promoveu a democracia participativa nos campos e assegurou o acesso do povo aos serviços públicos básicos, ações que impulsionaram sua enorme popularidade.
Em 1996, Jyoti Basu quase se tornou o primeiro-ministro da Índia, não tivesse o seu partido adotado o modelo de “apoio sem participação” no governo. No entanto, seu pragmatismo convenceu aos quadros dirigentes do Partido Comunista Indiano a abandonar os seus tradicionais fundamentos ortodoxos. Ao fazê-lo, reconheceu-se a impossibilidade da criação de uma sociedade comunista no momento, e a conveniência de buscar modelos de crescimento econômico nacional fundados no capital, nos moldes da bem-sucedida experiência chinesa.
Esse processo de transformação desencadeou uma reação de crescimento econômico generalizado em Bengala Ocidental, sem que seus líderes tivessem perdido a consciência das grandes desigualdades sociais existentes na Índia de hoje, as quais ainda compreendem não apenas as disparidades na distribuição de riquezas, como também a discriminação decorrente do tradicional regime de castas.
O legado histórico de Jyoti Basu é um de tolerância, de pragmatismo inteligente e de comprometimento com o humanismo, com a decência e com o bem comum. A Índia perdeu um grande homem, mas seu exemplo continuará bem vivo na memória de seu povo.
Advogado admitido no Brasil, Inglaterra e Gales e Portugal. Formou-se em direito pela PUC-SP em 1975. Árbitro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e da OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional na pós-graduação da Universidade Cândido Mendes (RJ).